O presidente Enrique Peña Nieto deve apresentar esta semana uma muito esperada proposta para mudar a Constituição do México e tentar atrair as grandes multinacionais do petróleo de volta aos campos do país pela primeira vez desde a nacionalização de 1938. A iniciativa poderia gerar bilhões de dólares em investimentos e melhorar a imagem do México como uma economia emergente.
É uma aposta arriscada, porém, para o novo presidente, que tomou posse em dezembro para um mandato de seis anos. A proposta, que deve ser enviada ao Senado na quarta-feira, é vista como uma iniciativa do tipo "ou tudo ou nada". Se aprovada, ela poderia fortalecer sua liderança na sua cruzada para realizar outras transformações no país, como uma reforma do código fiscal e do sistema judiciário.
A proposta poderia também, de modo mais geral, destacar o México como sendo uma oportunidade econômica, numa época em que o lento crescimento vem tirando o brilho de outros mercados emergentes, como o Brasil. Os economistas dizem que a iniciativa aumentaria a competitividade da economia mexicana e provavelmente reverteria o declínio na produção de petróleo, retornando o país ao clube dos grandes exportadores.
"Uma transformação no mercado de petróleo tem o potencial de finalmente colocar o México no centro do palco dos países emergentes", diz Benito Berber, estrategista da corretora Nomura Securities em Nova York. "Eu esperaria um crescimento de dois dígitos nos investimentos no ano que vem, se a reforma passar."
O governo de Peña Nieto quer dividir com empresas privadas os riscos inerentes à exploração de reservas de petróleo cada vez mais complexas, como as de águas profundas. Para isso, elas seriam autorizadas a produzir petróleo e gás através de sociedades e acordos de participação nos lucros com a estatal Petróleos Mexicanos, a Pemex. O modelo atual de contratos, que não permite que empresas perfurem por conta própria, atraiu somente prestadoras de serviços como a Schlumberger e a Halliburton, que trabalham em nome da Pemex.
As chances do projeto de lei parecem promissoras. Além do partido do governo, o PRI, a proposta também tem o apoio do PAN, o partido oposicionista de direita. Juntos, o PRI e o PAN têm a necessária maioria de dois terços na Câmara e no Senado para mudar a constituição.
Mas o partido de esquerda, o PRD, vai provavelmente se opor às mudanças e seu líder, o nacionalista Andrés Manuel López Obrador, candidato derrotado à presidência, deve tentar organizar manifestações de rua contra a medida. Se tais protestos ganharem impulso, eles poderiam causar problemas — uma das principais razões para o desejo do governo de votar o projeto em questão de semanas.
"O modo como o governo apresentar a reforma do petróleo, e a necessidade dela, será fundamental para o seu sucesso e para o resto do mandato do presidente", diz Alejandro Schtulmann, chefe da área de consultoria política da Empra, uma firma especializada no México.
As reservas mexicanas se tornaram inacessíveis para grandes petrolíferas como a Exxon Mobil XOM -0.85% e a Royal Dutch Shell RDSB.LN -0.32% desde que o ex-presidente Lázaro Cárdenas fez história como o primeiro estadista de um grande país produtor a tomar ativos de empresas estrangeiras, tornando-se um exemplo para outros líderes nacionalistas e um herói para o povo.
Mas em vez de virar as costas para Cárdenas, Peña Nieto e seu partido planejam argumentar que o antigo líder concordaria com as mudanças propostas.
De fato, a proposta do governo vai se basear nas leis vigentes quando Cárdenas deixou o poder, em 1940. Na época, a Constituição mexicana foi modificada de modo a proibir as concessões a empresas privadas, mas leis secundárias permitiam explicitamente a participação privada na exploração e produção de petróleo via contratos, incluindo os que compartilhavam lucros ou a produção.
Foi somente em 1960, em meio à Guerra Fria e à Revolução Cubana, que o México decidiu nacionalizar completamente seu setor energético, banindo esses tipos de contratos.
"É tempo de quebrar esses tabus que o presidente Cárdenas, que todos admiramos, nem sequer defendia", disse Manlio Fabio Beltrones, líder do PRI na Câmara. "Sem deixar de ser donos dos hidrocarbonetos, temos que ser capazes de encontrar bons sócios e dividir os lucros com eles."
Em 1938, quando as empresas de petróleo remetiam a maioria dos seus lucros para o exterior e desafiavam as leis locais, a tática de Cárdenas de endurecer o jogo tinha sentido. Hoje, porém, depois de décadas de investimentos insuficientes, o país enfrenta um declínio na produção e a falta de tecnologia. Estima-se que o México tenha a quarta maior reserva de gás de xisto do mundo, mas o país importa gás dos Estados Unidos, aumentando os custos de sua indústria.
O México foi um dos primeiros países a criar uma companhia estatal de petróleo, mas seria um dos últimos a extingui-la, e tem as leis de petróleo mais rígidas do mundo, depois de Coreia do Norte e Kwait. Países como Brasil, Noruega e Nigéria permitem que multinacionais compartilhem o risco e os lucros com a exploração de petróleo.
Os grupos mais nacionalistas dentro do PRI, que resistiram a mudanças profundas no passado, desta vez, parecem estar do lado do presidente. "A maioria no PRI apoia uma reforma do setor energético que não privatize a Pemex nem o petróleo", disse César Camacho, o presidente do partido.
Alguns membros do partido temem que a reforma do setor do petróleo provoque agitações sociais no país semelhantes às manifestações no Brasil.
López Obrador, o carismático populista, já convocou uma grande manifestação para 8 de setembro na praça principal da Cidade do México. Não está claro se ele vai tentar liderar passeatas ou ocupar a avenida principal, a Reforma, como fez ano passado.
"Vamos apelar para o povo mexicano, que é o único que pode impedir isso", disse Martí Batres, um assessor de López Obrador.
Mas os protestos só vão ter impacto se forem grandes e conseguirem mobilizar os setores apartidários da classe média. "Se López Obrador reunir somente seus próprios partidários, será apenas mais uma manifestação das centenas com que o México já está acostumado", diz Schtulmann, da consultoria Empra.
Fonte: The Wall Street Jounal
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