A presidente Dilma Rousseff prometeu um novo esforço nacional para melhorar os serviços de transporte e de saúde — principal demanda das massas de manifestantes que têm tomado as ruas neste mês.
O problema é que promover novos gastos é o oposto do remédio que muitos economistas dizem ser essencial para conter o aumento da inflação e os déficits do país.
O movimento de protestos começou na semana retrasada desencadeado pelo aumento das tarifas de ônibus em São Paulo e se transformou em um amplo repúdio contra os serviços do governo em geral e a corrupção.
Agora, os formuladores da política econômica estão de mão atadas. Antes de os protestos começarem, a maioria das discussões dentro do governo era centrada em como cortar gastos com a cotação do real no seu nível mais baixo desde 2009.
"O problema que eles têm é que precisam tranquilizar duas partes que estão muito nervosas, o mercado e a população, e elas demandam coisas diferentes", disse Pedro Barbosa, sócio do fundo de hedge STK Capital.
Na sexta-feira à noite, em um discurso em cadeia nacional, Dilma pediu calma, um dia após os manifestantes terem invadido o Ministério das Relações Exteriores e praticado atos de vandalismo no saguão de entrada.
Dilma, uma ex-militante de esquerda que se tornou a primeira presidente mulher do país, tentou demonstrar empatia com as reivindicações dos manifestantes. Ela defendeu um pacto nacional com os governadores para melhorar os serviços. Ela prometeu investir toda a receita esperada com as gigantes reservas do pré-sal em educação.
"Se tirarmos proveito desta nova força política, podemos fazer muitas coisas que o Brasil ainda não foi capaz de fazer", disse.
Mas os protestos não cessaram após o discurso de Dilma. Manifestantes em São Paulo bloquearam o acesso ao Aeroporto Internacional de Guarulhos, obrigando os passageiros a descerem dos carros com suas malas e seguirem pela estrada para tentar não perder seus voos.
As autoridades do Rio de Janeiro relataram saques. Em Belo Horizonte, no sábado, mais de 60.000 pessoas se reuniram nas ruas e entraram em confronto com a polícia perto do Mineirão, estádio onde ocorria a partida entre o Japão e o México pela Copa das Confederações. Mais de uma dúzia de pessoas ficaram feridas.
Em outras partes do país, os manifestantes voltaram às ruas em menor número e com menos intensidade, deixando as autoridades otimistas. Em São Paulo, por exemplo, uma multidão de 30.000 pessoas marchou contra a corrupção, incluindo muitas famílias com crianças. Alguns manifestantes que voltaram às ruas disseram ter pouca esperança de que Dilma poderá cumprir as promessas feitas no seu discurso.
"Dizer que você vai melhorar a educação, a saúde e o transporte, é fácil, mas o que realmente é preciso é pôr um fim a toda essa corrupção que acaba roubando de qualquer forma os investimentos", disse Celso Capela, um camelô de Salvador.
Mas mesmo que Dilma seja capaz de colocar nos trilhos a sua visão de melhora dos serviços públicos, o bom senso indica que o único jeito de arcar com isso seria gerando mais dívida.
"Não há espaço para reduzir os custos", disse o líder do PT na Câmara dos Deputados, o deputado José Guimarães.
Em entrevista ao The Wall Street Journal, ele disse que pressionaria pela votação de um projeto de lei que defende uma das principais ideias de Dilma, de destinar os royalties das novas reservas de petróleo para a educação. O projeto tem enfrentado a resistência dos legisladores que defendem que os recursos sejam transferidos aos Estados, mas o clima político atual no país pode acabar mudando as coisas.
Dilma também quer importar cerca de 6.000 médicos de Cuba e da Europa, devastada pela recessão, para reforçar os serviços públicos de saúde.
O aperto financeiro não é apenas um problema no nível federal.
As cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro já recuaram no aumento da tarifa de ônibus que desencadeou os protestos. O prefeito do Rio, Eduardo Paes, disse na semana passada que a medida vai custar à cidade cerca de US$ 100 milhões por ano, o que significa menos investimentos em outras áreas. "Vai ser um sacrifício", disse.
Paulo Petrassi, gestor de fundos da Leme Investimentos, em Florianópolis, disse que, antes de os protestos começarem, os investidores estavam preocupados principalmente com a alta da inflação e os déficits no orçamento.
Os investidores estavam esperando cortes no orçamento para atender a legislação brasileira de limite de gastos que busca manter a estabilidade econômica. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse na semana passada que o governo está preparado para fazer ajustes adicionais nos gastos, se necessário.
Mas muita coisa mudou no Brasil desde então.
A queda do mercado indica que os investidores acreditam que a prioridade de Dilma será aumentar os gastos para atender às demandas populares — não apertar o cinto.
Na semana passada, o mercado de ações atingiu o seu nível mais baixo desde a recessão global de 2009. A alta dos rendimentos dos títulos refletiu a opinião dos investidores de que o Banco Central terá de elevar as taxas de juros acima do previsto inicialmente para combater a inflação crescente.
Mas apesar de as reivindicações dos manifestantes e dos investidores parecerem contraditórias, Barbosa, da STK Capital, diz que ambos compartilham uma causa importante.
"A reivindicação básica dos dois é por mais eficiência, menos corrupção, mais transparência", disse ele. "Minha esperança é que o governo capte a mensagem certa e comece a enfrentar essas coisas."
Fonte: The Wall Street Journal
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