Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Crédito paralelo gera receios de crise financeira na China

Nos escritórios da Citic Trust Co., na capital da China, cerca de 400 funcionários providenciam financiamentos para incorporadoras, siderúrgicas e outras empresas desesperadas por dinheiro e rejeitadas pelos bancos tradicionais do país.

A Citic e as outras instituições que compõem o sistema de crédito paralelo da China, chamadas de "shadow banks" (bancos-sombra), criaram o que o país tem de mais parecido com uma cultura de mercado de capitais. Elas correm riscos que os bancos convencionais evitam, chegando ao ponto de criar fundos de investimento para ativos como bebidas alcoólicas caras e móveis de primeira linha. Seus principais executivos dirigem carros de luxo e frequentam clubes elegantes.
Agora, essas instituições paralelas — um conjunto de companhias fiduciárias, seguradoras, empresas de leasing, casas de penhora e outros financiadores informais sujeitos a menos regulamentação — são o elemento principal do receio crescente de que uma crise de dívida venha a estourar na desacelerada economia da China.

Nos últimos dias, o governo chinês tomou providências para conter os empréstimos não regulamentados. O mercado de ações da China registrou na segunda-feira sua maior queda diária em quase quatro anos, 5,3%, depois que o banco central anunciou restrições ao aumento descontrolado do crédito.

O Banco Popular da China começou este mês a cortar financiamentos para o mercado de crédito interbancário do país, em que os bancos emprestam uns aos outros e para algumas grandes instituições de crédito paralelo. Isso fez a taxa de juros interbancários, geralmente na faixa de 2% a 3% ao ano, bater em 25% antes de baixar de novo. Ela ficou em 6,64% na segunda-feira e fechou ontem em 5,8%.

Num sinal de que estava tentando relaxar o aperto de crédito, o banco central comunicou ontem que recentemente injetou fundos em algumas instituições financeiras para preservar a liquidez. O anúncio fez a bolsa de Xangai, que havia começado o pregão recuando novamente mais de 5%, reagir e fechar o dia com queda de apenas 0,2%.
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A agência de notícias oficial da China, a Xinhua, informou no domingo que o banco central engendrou esse aperto de crédito para reduzir as atividades de empréstimos alternativos, indicando que o foco de sua política monetária começou a mudar de "quantidade" para "qualidade". A Xinhua afirmou que há "muito dinheiro à procura de investimentos especulativos e o crédito para o setor privado ainda é generalizado".

Economistas dentro e fora da China temem que o crédito paralelo esteja introduzindo riscos semelhantes ao boom das hipotecas nos Estados Unidos, ao financiar projetos que podem nunca dar retorno, ao não revelar completamente aos investidores o que estaria sendo financiado e ao dar a impressão de que proporcionam aos bancos uma maneira de se livrar de empréstimos problemáticos — sem realmente fazer isso.

O banco central decidiu que tinha de agir agora para evitar que os problemas financeiros fiquem fora de controle, diz Charlene Chu, diretora da Fitch Ratings Inc. em Pequim. "Quanto maior o problema, mais difícil fica gerenciá-lo."

Esses agentes alternativos de crédito conseguem dinheiro tomando emprestado dos bancos convencionais ou atraindo investidores ricos em busca de rendimentos mais altos. Mas à medida que os bancos convencionais têm dificuldade de obter fundos, sobra menos para emprestar aos agentes paralelos. Além disso, o aperto no crédito poderia levar investidores a pensar duas vezes antes de colocar dinheiro em instituições consideradas menos seguras que os bancos.

Os bancos convencionais da China são estatais e na maioria das vezes emprestam para grandes empresas também estatais, em detrimento de outros potenciais tomadores. O rendimento dos depósitos é fixado pelo governo — que permite pouquíssima concorrência — e as taxas de remuneração ficam geralmente abaixo da inflação, aguçando o apetite dos depositantes por juros maiores.

É aí que as instituições alternativas entram em cena. Num exemplo típico, uma empresa que precisasse de dinheiro para uma siderúrgica, uma estrada ou outro projeto poderia obter um empréstimo de curto prazo a uma taxa de juros alta. O agente paralelo, sozinho ou com outros, transformaria, então, aquele empréstimo num produto de investimento que pudesse vender para investidores, prometendo um rendimento maior em retorno, financiado pelos pagamentos do empréstimo.

O sistema de crédito paralelo da China surgiu nos anos 80, quando as autoridades aprovaram algumas empresas fiduciárias para que financiassem certas exportações e executassem outras tarefas consideradas arriscadas demais para os bancos convencionais. O segmento, que passou por altos e baixos e durante anos foi usado pelo governo para testar práticas de mercado proibidas aos bancos, é hoje uma parte crescente do setor financeiro da China.

Entre 2010 e 2012, depois que o governo passou a regular mais pesadamente os bancos convencionais para conter o dinheiro fácil, o sistema paralelo dobrou seu volume de empréstimos para 36 trilhões de yuans (US$ 5,8 trilhões), ou cerca de 69% do produto interno bruto da China, segundo estimativas do J.P. Morgan Chase JPM +0.81% & Co. Nas companhias fiduciárias, um pilar do sistema paralelo, os ativos administrados quase triplicaram para 8,7 trilhões de yuans, fazendo desse tipo de empresa o segundo maior segmento de serviços financeiros do país depois dos bancos.

As instituições de crédito paralelo não são reguladas tão de perto quanto os bancos tradicionais e com frequência não divulgam muita informação sobre onde estão investindo ou sobre o desempenho de seus empréstimos. Muitas vezes elas dão crédito a projetos de infraestrutura ou imobiliários que não se qualificariam para os empréstimos de bancos convencionais.

"As empresas fiduciárias sempre se espelharam nos bancos de investimento, o que significa um tipo de 'cultura de caçador' que requer uma procura permanente por oportunidades de negócios", disse Wang Jingxiong, que até há um mês era gerente da Citic, num ensaio amplamente circulado na internet.

Analistas e economistas dizem que não está claro o nível da inadimplência nos sistema de crédito paralelo. Até agora, investidores não sofreram nenhum prejuízo de fato com empréstimos de companhias fiduciárias porque tomadores problemáticos vêm sendo socorridos pelo governo. Tais resgates tornam o governo vulnerável a prejuízos maiores se a inadimplência aumentar, uma preocupação crescente à medida que a economia da China perde força.

No mínimo, afirmam alguns economistas, esses credores alternativos estão ajudando a manter as fábricas vivas em setores com excesso de capacidade ou incentivando projetos que o país não necessita — e contando com o governo para garantir que eles serão pagos.

A principal preocupação é que essa "dívida oculta" em algum momento exploda nos balanços do Estado em plena desaceleração, em última análise gerando um problema que o governo deve absorver, diz o economista da Universidade Harvard Kenneth Rogoff, ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional.

Poucos economistas preveem uma crise financeira iminente na China, em parte porque o país possui uma taxa de poupança elevada, o que mantém os cofres dos bancos chineses cheios. O governo também tem reservas consideráveis ​​para ajudar a lidar com situações de emergência. Mas turbulências no setor de crédito alternativo poderiam repercutir em outras partes do setor financeiro e forçar mais medidas do governo para restringir o crédito. Isso poderia desacelerar a economia ainda mais. Alguns economistas agora preveem que a China vai crescer este ano menos do que a meta do governo de 7,5%, após 15 anos consecutivos superando a meta anual.

Fonte: The Wall Street Journal

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