Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Não há "fuga" de capital externo

É muito difícil comprovar a afirmação de que está havendo uma fuga expressiva de capitais estrangeiros do país.

O contrário, como vem sustentando esta coluna, é muito simples. Prova 1: o Banco Central divulgou na sexta-feira números sobre o comportamento do fluxo cambial (tudo que entra e sai do país) em junho até o dia 19.

A saída líquida de capitais pela conta financeira foi de US$ 209 milhões no período, um saldo ridículo, tão pequeno que nem pode ser considerado insignificante. Saíram mais dólares pela conta comercial (o saldo de exportações e importações foi negativo em US$ 488 milhões) do que pela financeira. O estrangeiro que quis ir embora nem precisou recorrer ao Banco Central.

Utilizou os dólares depositados nas posições compradas à vista dos bancos comerciais, que se reduziram de US$ 5,408 bilhões para US$ 4,473 bilhões. Num quadro de crise e de fuga maciça, eles não encontram a moeda sobrando nas instituições privadas. Prova 2: relatório do Barclays mostrou que no período de uma semana encerrado no dia 19 os fundos de ações e títulos dedicados a países emergentes fizeram saques de US$ 6 bilhões. Isso, no mundo inteiro.

A saída líquida ocorrida somente nos fundos latino-americanos foi de US$ 3 bilhões. De novo, trata-se de quantia inexpressiva, que não se pode chamar de fuga. Ainda não há dados sobre os dias posteriores à decisão do Fed de confirmar o início da normalização monetária para o fim do ano. Mas o comportamento geral dos emergentes não aponta para correrias.

Prova 3: o BC fez na sexta-feira o 11º leilão de swaps cambiais, instrumentos que fornecem hedge em dólar. Aceitou todas as 37,3 mil dos 40 mil contratos oferecidos (prova de que não há procura suficiente por proteção capaz de absorver toda a oferta), no valor de US$ 1,83 bilhão.

Do dia 31 de maio até sexta-feira, colocou no mercado um total de US$ 17,8 bilhões em hedge. Trata-se de apenas 13,7% do total do endividamento externo de US$ 130 bilhões do setor privado brasileiro, segundo estudo da Austin Rating. E o BC não vendeu nenhum centavo das reservas para abastecer os relutantes fugitivos.

Esses números mostram que o investidor estrangeiro está tranquilo não só em relação às mudanças em curso na política monetária americana, mas também às possíveis consequências da onda de manifestações populares e às eventuais medidas populistas que possam ser tomadas para esvaziar os protestos.

Desses três fatores, o mais relevante é o primeiro, como mostra o comportamento exibido pelo dólar na sexta-feira. A moeda chegou a subir de manhã para até R$ 2,27, desencadeando a oferta de hedge pelo BC. Mas fechou em queda de 0,66%, cotada a R$ 2,440. Nada a ver com a intervenção da autoridade. O BC não está preocupado em montar barricadas no caminho de alta do dólar.

Elas seriam facilmente derrubadas se o mercado as encarasse como um desafio. Ele apenas põe pedregulhos para dificultar o avanço, dando proteção a quem precisa. A queda ocorreu unicamente em função do arrependimento do presidente da regional de St Louis do Fed, James Bullard.

Na reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) da semana passada, surpreendentemente Bullard alinhou-se à conservadora presidente do Fed de Kansas, Ester George, em favor de um posicionamento mais hawkish do colegiado.

Enquanto a dissidência dentro do Fomc, composto por 19 membros, se restringia unicamente a George, o mercado nem se importava dada a sua histórica intransigência republicana aos afrouxamentos quantitativos. A adesão de Bullard preocupou.

Mas, na sexta-feira, expediu um comunicado oficial em que tentou suavizar as interpretações dadas pelo mercado a seu voto. Conseguiu, tanto que os mercados se acalmaram mundo afora. "O presidente Bullard sentiu que a decisão do Comitê de autorizar o chairman a divulgar um plano mais elaborado para reduzir o ritmo de compra de ativos foi feita num momento inapropriado", diz o comunicado.

O que ele quis dizer com "momento inapropriado"? Como a inflação está muito baixa, pode ficar muito aquém da meta de inflação do Fed, de 2%. Nesse caso, ele sugere que o Fed até poderia elevar o volume mensal de compras de títulos, de US$ 85 bilhões, e não de reduzir, conforme deixou claro o presidente Ben Bernanke.

Esse cenário de calmaria externa pode ser revertido a qualquer momento. Basta a divulgação de indicadores mais promissores sobre o desempenho da economia americana ou a adoção pelo governo brasileiro de medidas fiscais mais expansionistas para atender os anseios dos manifestantes.

A tendência primária de alta do dólar persiste. Haveria um teto técnico intransponível? Alguns economistas defendem a ideia de que, se o nervosismo persistir nos mercados globais, a taxa de câmbio real poderá atingir o patamar técnico de equilíbrio, hoje estimado entre R$ 2,30 e R$ 2,40. Alcançado esse degrau, seria muito difícil ir além. Ao chegar em R$ 2,30 ou R$ 2,40, o dólar tenderia a perder gás. Como, num câmbio flutuante, não fica parado, cairia.

Paulo Gala, estrategista do Banco Fator, professor da FGV-SP e especialista em câmbio, diz que não é bem assim. A taxa de câmbio real de equilíbrio seria um bloqueio "tudo o mais constante", ou seja, se a inflação não saísse do lugar.

É claro que o repasse da variação cambial ao IPCA seria feito pelo dólar médio de um período longo, mas algum repasse haverá. "Para uma inflação de 6%, a taxa de câmbio real de equilíbrio pode ser algo entre R$ 2,30 e R$ 2,40. Mas se, pela conjugação de outros fatores, o IPCA avançar para a faixa de 7%, o câmbio de equilíbrio já estará se deslocando para R$ 2,50", diz Gala.

Em caso de piora da cena global, o BC poderá acrescentar mais um instrumento de contenção à disparada do dólar. Como já fez no passado, poderia definir uma ração diária de venda de moeda das reservas. Algo como US$ 50 a 100 milhões todos os dias até um limite que não comprometa a integridade da moeda.

O investidor que precisar sair saberá que pelo menos uma cota mínima será fornecida, não precisando se submeter integralmente aos preços do mercado. É importante preservar as reservas porque o próprio BC já elevou, para US$ 75 bilhões, sua projeção de déficit em transações correntes no fim do ano.

Como o Investimento Estrangeiro Direto (IED) irá garantir US$ 65 bilhões, faltarão US$ 10 bilhões, a serem sacados das reservas, já que não se pode contar nesse momento com o dinheiro dos investidores externos em renda fixa e ações. 

Especulação não é atributo exclusivo do mercado de câmbio. No pregão de juros futuros da BM&F o tiroteio é generalizado. O movimento de alta se aproveita do clima geral de desconfiança para não respeitar indicadores ou queda do dólar.

As altas do DIs persistiram a despeito da debilidade dos dados de emprego do Caged. Em maio, o saldo líquido foi de 72,03 mil vagas, quando o mercado previa em média cerca de 150 mil.

Mas a taxa para janeiro de 2014 subiu de 9,10% para 9,16%. Só a ponta longa da curva de juros, que segue o mercado externo, recuou. O DI para janeiro de 2017 retrocedeu de 11,63% para 11,56%.

A intervenção do Tesouro destinada a garantir liquidez aos títulos públicos quase foi desnecessária. Dos leilões de recompra de LTN, NTN-F e NTN-B planejados, fez apenas um resgate antecipado deste último papel, em volume irrisório, de R$ 25 milhões.

Fonte: Brasil Econômico

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