Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Os paradoxos da economia brasileira, segundo Langoni

Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central do Brasil, que hoje ocupa os cargos de diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getulio Vargas e de assessor da FGV Projetos, argumenta que a economia do país enfrenta três paradoxos. O primeiro é a luta do banco central entre combater a inflação e evitar uma valorização excessiva do real. Nesse campo de batalha, Langoni defende a decisão do BC de dar prioridade à inflação. "O índice de inflação é muito alto, mesmo para o Brasil", diz ele.

O segundo é que, apesar das críticas sobre a forma como o país administra a sua economia e da desaceleração do crescimento, o investimento estrangeiro direto continua entrando e os mercados continuam dispostos a emprestar para o Brasil a taxas bastante convenientes. A terceira é que a desaceleração da economia não tem afetado o emprego.

Langoni, que está em Nova York para participar de uma conferência sobre a economia global e o Brasil organizada pela FGV Projetos e pela Câmara Americana de Comércio (Amcham Brasil), advertiu, em entrevista ao The Wall Street Journal, que o fim do ciclo de alta dos preços das matérias-primas traz à tona debilidades estruturais importantes. Alguns trechos editados da conversa:

WSJ: O sr. concorda com o banco central de que a inflação é a prioridade número um?

Carlos Langoni: Sem dúvida. A inflação está rodando a casa dos 6%, o que é muito alto, mesmo para o Brasil. A inflação no setor de ativos não comercializáveis é ainda maior, em torno de 8%. Você tem aqui um paradoxo. Para combater a inflação, temos de aumentar as taxas de juros e o banco central começou a fazer isso de uma forma muito gradual. A taxa de referência terá de subir de 7,5% para algo em torno de 8% até o fim do ano. Isso vai atrair mais capital no curto prazo, pois as taxas de juros em todo o mundo estão basicamente em terreno negativo.

WSJ: O sr. tem alguma previsão para a taxa de câmbio para este ano?

Langoni: Acho que a taxa de câmbio vai se manter em torno de dois reais por dólar e vai ficar nesse nível em 2013 todo. Isso significa que o banco central terá de trazer de volta um IOF alto (imposto sobre operações financeiras) para empréstimos de curto prazo ou terá de fazer alguma intervenção direta nos mercados.

WSJ: Muitos dos concorrentes do Brasil como a Coreia do Sul, países do Leste Europeu e até mesmo o México vêm baixando as taxas de juros. Isso o preocupa?

Langoni: Apesar da crise na Europa e, com a exceção de 2006, o primeiro semestre de 2008 e o primeiro semestre de 2009, o Brasil vem recebendo um fluxo constante de Investimento Estrangeiro Direto (IED) que, acredito, só perde para a China. São cerca de US$ 65 bilhões, soma muito maior do que a de qualquer outro país emergente na América Latina e mesmo do Leste Europeu. O fato de que nós somos capazes de atrair um fluxo constante de capital no longo prazo [...] é o indicador mais importante e é o que o governo deveria estar olhando. Se o IED começar a cair, esse será um sinal de alerta. Até agora, a imagem que s vê no IED é boa. E esse é o paradoxo sobre o Brasil. As pessoas falam sobre a percepção de que as bases econômicas do país não são tão fortes, mas se você olhar para indicadores objetivos sobre a percepção do mercado, como a o spread de títulos de dívida brasileiros e especialmente o IED, a percepção parece ser bastante favorável.

WSJ: O México parece estar fazendo certas coisas que o Brasil não foi capaz de fazer em termos de reformas de mercado. Isso o preocupa?

Langoni: A verdade é que alguns países da América Latina estão se saindo muito bem. Eles têm sido capazes de fazer reformas de mercado, abriram a economia mais do que o Brasil e tiveram sucesso combatendo a inflação. Acho que o que aconteceu, especialmente no fim de 2009, quando o Brasil foi um dos primeiros países a sair da recessão, foi um exagero de otimismo e agora há uma correção.

WSJ: O sr. concorda que o superciclo das commodities é coisa do passado?

Langoni: Acabou. A China já não vai mais crescer a um ritmo de 10% ao ano. Agora o crescimento está em torno de 7%. A Índia já não está crescendo 8% ao ano. O fato de que esse ciclo acabou expôs algumas vulnerabilidades estruturais da economia brasileira que o país precisa enfrentar. Precisamos de uma reforma do mercado de trabalho, temos um imposto sobre a folha de pagamento muito elevado, que o governo está cortando. Precisamos de uma reforma tributária ampla.

WSJ: O sr. acredita que o Brasil está pronto para viver em um mundo onde os preços das commodities serão muito mais baixos do que nos últimos 10 anos?

Langoni: Isso é um verdadeiro desafio que o Brasil tem de enfrentar. Acho que o país terá de mover-se de uma vantagem comparativa natural que ajuda, mas não é suficiente, para um crescimento estável em torno de 4% ou 5%, que é a meta do país. Precisamos investir mais em inovação e tecnologia [...]. Precisamos melhorar a qualidade do capital humano, da educação. Uma das melhores notícias que eu li sobre o Brasil e a política do governo ultimamente foi a decisão de utilizar 100% dos royalties dos novos campos de petróleo e gás para investir na educação. É uma decisão que tem muito sentido.

WSJ: O sr. acha que um eventual recuo da liquidez do banco central nos mercados será um desafio para o país ou poderia terminar tudo bem?

Langoni: Se a redução de liquidez for feita de uma forma gradual e não afetar a recuperação dos EUA, em especial, pode ser até positivo. Os efeitos externos da chamada guerra cambial, no fim do dia, serão mínimos.

WSJ: O sr. então acredita que, apesar dos desafios, a economia brasileira vai bem.

Langoni: Não. É uma melhoria gradual. Este ano, a economia vai crescer cerca de 3%, mas há um quebra-cabeças. Mesmo que o PIB venha se desacelerando e tenha crescido só 1% no ano passado, o desemprego é muito baixo. A base da oferta agregada, investimentos na produção, especialmente a industrial, é muito baixa. Mas quando você olha para a demanda, especialmente o consumo de bens, estamos falando de 6% em termos reais. Isso mantém o mercado de trabalho muito apertado, que, por sinal, tem um efeito colateral que é a inflação alta.

Fonte: The Wall Street Journal

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