A eleição acabou, e os eleitores optaram por manter o status quo: um governo dividido nos Estados Unidos.
Isso pode ter grandes implicações nos próximos meses para os investidores em uma ampla faixa de ativos, de ações e renda fixa até o dólar, dizem consultores financeiros e estrategistas de mercado.
O principal fator a influenciar os mercados no momento é o iminente "abismo fiscal". Se os legisladores não chegarem a um acordo, os aumentos de impostos para 2013, totalizando US$ 532 bilhões, vão entrar em vigor em 1o de janeiro, juntamente com cerca de US$ 136 bilhões em cortes de gastos federais.
Segundo a Comissão de Orçamento do Congresso dos EUA, isso poderia fazer a economia se contrair 0,5 ponto porcentual no ano que vem, com o desemprego saltando de 7,9% em outubro para 9,1% em 2013.
A mera possibilidade de tal resultado causou nervosismo nas bolsas nos dias após a eleição.
O presidente Barack Obama e líderes do Congresso expressaram confiança de que chegarão a um acordo, mesmo que isso implique adiar o prazo final por alguns meses para conseguir mais tempo. Mas os precedentes não são animadores: em 2010 e 2011, o Congresso esperou até o último minuto para evitar, respectivamente, um aumento de impostos e a quebra do limite de endividamento dos EUA — deixando, enquanto isso, os mercados em tumulto.
Alguns gestores de fortunas esperam o pior. "Estamos aconselhando aos nossos clientes que assimilem as mudanças que entrarão em vigor em 1o de janeiro", diz Aaron Gurwitz, diretor de investimentos da divisão de gestão de riqueza e investimentos do Barclays, que recomenda aos clientes conservar alguns papéis de longo prazo por segurança.
Mesmo se o abismo fiscal for evitado, em 2013 os investidores terão que observar bem de perto o que ocorre em Washington. Políticas presidenciais como a reforma da saúde e a regulamentação financeira continuarão a ser implementadas, com grandes ramificações para os bancos e as empresas ligadas à saúde.
O fim do prazo que se aproxima pode trazer uma volatilidade ao mercado semelhante à ocorrida durante o debate sobre o teto da dívida, em meados de 2011, diz Lew Altfest, diretor de investimentos da Altfest Personal Wealth Management, de Nova York. Em julho de 2011, o índice de 500 ações da Standard & Poor's caiu 3,6% nas vésperas da renegociação da dívida — e despencou de novo depois que a S&P rebaixou a classificação de crédito dos EUA devido à situação política instável do país. As bolsas se recuperaram depois disso.
Um mau sinal: na semana passada, o S&P 500 caiu 3,6% em apenas dois dias após a eleição.
Mas a volatilidade do mercado pode oferecer oportunidades para os investidores. No longo prazo, alguns setores podem ter um desempenho especialmente bom, à medida que o governo Obama vai pondo em prática suas políticas no segundo mandato, diz Daniel Clifton, diretor de pesquisa política na Strategas, firma de pesquisa de investimentos. Entre os possíveis vencedores, ele cita empresas de cuidados de saúde, como hospitais e empresas de tecnologia médica, que vão se beneficiar à medida que a lei da reforma da saúde continuar sendo implementada.
Já na renda fixa, como se o rendimento dos títulos de dívida do Tesouro americano já não estivesse baixo, os estrategistas alertam que podem cair ainda mais se o abismo fiscal não for evitado logo. O rendimento, que se move no sentido oposto ao preço, caiu de 1,74% para 1,63% nos dois dias após a eleição, para as treasuries de 10 anos.
Assim, os investidores que contam com a renda fixa como receita enfrentam uma escolha difícil: ganhar menos com seus títulos, ou buscar aplicações mais arriscadas e rendimentos maiores.
Os investidores também podem considerar os títulos de mercados emergentes em dólares, diz Dan Heckman, estrategista sênior de renda fixa no departamento de gestão de riquezas do U.S. Bank em Kansas City, no Estado de Missouri. São papéis que rendem mais que as notas do Tesouro, e a economia de muitos países em desenvolvimento está melhorando.
Um fundo negociado em bolsa, ou ETF, de US$ 6,2 bilhões, o iShares da JP Morgan USD Emerging Market Bond ETF, que detém papéis de dívida do Brasil, Rússia e México, entre outros, tem rendimento de 3,3% e deu retorno total de 15,1% este ano, comparado com 1,7% de rendimento e retorno total de 4,4% do Barclays Aggregate Bond Index, que acompanha o mercado de títulos de baixo risco dos EUA.
A incerteza fiscal já está ajudando o dólar, tradicionalmente visto como refúgio. O Wall Street Journal Dollar Index, que mede a força do dólar contra uma cesta de sete moedas, subiu 0,1% nos dois dias seguintes à eleição.
"O abismo fiscal está mais perto, e parece que isso atingiu os investidores com muito mais impacto do que qualquer um esperava", diz Andrew Wilkinson, estrategista-chefe de economia na operadora institucional Miller Tabak, em Nova York. "A ascensão do dólar vai continuar até ouvirmos algo de construtivo nas discussões" no Congresso.
Mas se o abismo fiscal não se resolver em breve, o dólar pode enfraquecer. Nesse caso, os investidores poderão considerar moedas mais arriscadas de mercados emergentes como o peso mexicano, o won coreano ou o dólar de Taiwan, diz Alan Ruskin, estrategista de câmbio do Deutsche Bank em Nova York, já que essas economias devem se beneficiar de um melhor crescimento global.
Uma palavra de cautela: os investidores preocupados com uma eventual queda do dólar devem tomar cuidado com o ouro, diz Michael Haigh, chefe de pesquisas de commodities do Société Générale em Nova York. O ouro subiu 10,2% este ano, e mais que dobrou nos últimos 5 anos.
O metal é visto sobretudo como moeda alternativa, em especial quando os bancos centrais estão imprimindo dinheiro — e normalmente se valoriza quando o dólar está fraco. Mas se os políticos negociarem com êxito o abismo fiscal, a economia americana poderá ficar mais forte do que o esperado — o que pode fortalecer o dólar.
A conclusão, diz Haigh, é que, embora o ouro possa mostrar ligeira alta nos próximos meses devido à incerteza do abismo fiscal, "ele talvez já tenha dado o seu último grito de vitória".
Fonte: The Wall Street Journal
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