Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Para economista, infraestrutura e burocracia chegaram ao limite no país


A falta de estradas decentes e complicações para importar e exportar não serão temas exclusivos de empresários. Vão virar agenda social.

A previsão é do economista Marcos Lisboa, recém-saído do Itaú Unibanco, hoje no Insper. Um dos formuladores da "agenda positiva", ele diz que o lapso de infraestrutura chegou ao limite.

"Talvez tenha chegado num nível tal que não dá mais, como a violência nos anos 90", diz ele, nesta entrevista à Folha.

Em recente estudo com o economista Samuel Pessôa, colunista da Folha, Lisboa diz que reformas feitas nos anos 2000 estimularam o setor de serviços. Mas a indústria, dependente de grandes obras, ficou para trás.
O economista Marcos Lisboa, 48, durante entrevista no Insper
Marcos Lisboa, 48, economista do Insper, diz que é preciso criar estrutura para o Brasil promover grandes obras


Folha - A tese de que o câmbio valorizado foi vilão da indústria é equivocada?
Marcos Lisboa - Acho que essa história sobre o câmbio --e sobre a macroeconomia em geral-- acaba tendo a importância exagerada porque o Brasil, durante muitas décadas, teve uma macroeconomia muito desequilibrada. Então o câmbio, assim como juros e inflação, ganharam importância no debate. Mas nos últimos anos, ele tem sido mais reflexo do que causa do andamento da economia.

O que afetou a indústria foi a falta de reformas? É correto dizer que estamos há dez anos sem reformas relevantes?
Eu não diria isso. Esses movimentos são mais lentos. Não são grandes reformas. Tivemos um processo de estabilização, de construção de uma institucionalidade para uma economia que passou muitos anos desequilibrada. Isso foi progressivo.

A partir da década passada, a gente começou a colher um pouco os benefícios dessas melhorias. Tivemos diversos setores no Brasil que cresceram muito bem nesse período e com grandes conquistas para a sociedade.

Que setores se saíram bem?
Todo esse Brasil urbano, que teve ganho de produtividade, dos serviços, de consumo, e que emprega muita gente. Com isso, as taxas de desemprego caíram para níveis que nunca imaginávamos. E a consequência foi uma queda da desigualdade.

Mas teve toda uma parte importante que não teve os mesmos benefícios. Nossa hipótese é que os setores para os quais são necessários investimentos complexos acabam mais penalizados pelas dificuldades do nosso marco regulatório.

É complicado exportar, importar, construir uma estrada, uma hidrelétrica. Isso significa custos maiores de produção, maior incerteza sobre o investimento.

Por que a agenda para esses setores travou?
Como envolve mais instâncias nos diversos níveis de governo, essa agenda acabou sem o foco ou o debate que poderia ter tido.

Acho que o país agora começa a discutir essa agenda, que não se esgota nos grandes debates. As dificuldades são os detalhes: quem autoriza determinado tipo de obra? Quem vai fiscalizar, qual é o critério de realização? Você vai fazer uma grande rodovia, as pessoas vão ter terrenos desapropriados, como será esse processo? Para nada disso temos uma estrutura.

A questão não é tornar mais fácil fazer a obra ou não. É tornar o processo mais eficiente e ter clareza do que pode e do que não pode fazer.

É uma agenda extensa de melhoras institucionais, que vai aperfeiçoar processos de autorização, de controle, de negociação de conflitos, que vai permitir a expansão dos investimentos e a redução do seu custo. Isso se traduz em eficiência para a economia.

A quantidade de problemas que têm aparecido tem tornado essa agenda ainda mais claramente necessária.

Que problemas o sr. ressalta?
Fornecimento de energia, construção de estradas, a parte logística. A nossa dificuldade de ter um avanço adequado na oferta de infraestrutura.

Essa "agenda perdida" explica a desaceleração de agora?
Acho que ela explica porque a gente cresce menos do que poderia. Na medida em que os problemas vão sendo enfrentados, isso tem impacto positivo sobre a taxa de crescimento de longo prazo. Na medida em que os problemas vão se agravando, ela tem um impacto negativo.

Há uma série de pequenos avanços que vão aperfeiçoando o funcionamento dos mercados. Quando essas medidas geram ganhos de produtividade nos setores onde estão ocorrendo, isso gera maior crescimento até que esses ganhos se esgotem.

Em que fase estamos?
A gente teve um ciclo bom de crescimento. Teve um choque externo em 2007 e 2008. E os setores que estavam na liderança desse crescimento têm tido expansão menor. O ciclo de produtividade tem uma vida e parece que está se esgotando nesses setores.

Então a economia está se afastando do crescimento alto, dos serviços, e convergindo para o baixo, da indústria?
O Brasil está tendo um crescimento sustentável, mas baixo. E acho que temos a oportunidade de crescer mais. Se o país mergulhar nessa agenda, há grande oportunidade de ter um ciclo longo de investimento. O Brasil tem condições de crescer não 3%, mas 4%, 5% ao ano, enfrentando seus desafios.

Com esse esgotamento, é preciso avançar em outras áreas?
Quando se tem uma agenda que melhora a infraestrutura, isso tem efeitos positivos sobre toda a economia.

Quando se consegue reduzir custos de energia porque houve ganhos de produtividade, quando se consegue melhorar eficiência no processo de importação e exportação --que passa por portos, mas também pela burocracia dos processos--, isso ajuda o investimento e a melhorar a qualidade do investimento.

Quando há mais clareza e definição do que pode e do que não pode e agilidade nesse processo, isso melhora a qualidade para se investir mais e nos lugares certos.
Com essa complexidade dos processos, o que acontece é que alguns investimentos começam e param em obstáculos, atrasam... e cada vez que isso ocorre, vira custo para os novos projetos.

Recuperar a produtividade é reduzir custos das empresas?
Tem de ser redução de custo para a economia. É uma diferença importante. Por exemplo, a tarifa de importação para um setor o protege de concorrência externa, mas aumenta os custos dos consumidores. Existe uma diferença grande entre medidas de proteção ou de estímulo que levem a transferências de recursos entre os setores e medidas que permitam ganho de produtividade para toda a economia.

É preciso reduzir salários para recuperar a produtividade?
Alguns setores tiveram ganhos de produtividade e esses setores são fortes empregadores. Os salários aumentaram e afetaram os setores que estavam com a produtividade crescendo menos. Agora, melhoras na produtividade, sobretudo em infraestrutura, têm impactos difusos sobre a economia. Você aumenta a capacidade de geração de renda como um todo.

Como o impacto é difuso, quem o sr. imagina que vá empunhar essa bandeira?
Exatamente por ser difusa é que ficamos tão atrasados nisso. Temas que têm benefícios muito localizados são mais fáceis de entrar no debate do que temas que têm efeitos sobre todos nós.

Mas acho que tem começado a entrar e talvez tenha chegado num nível tal que não dá mais. Foi um pouco como a violência nos anos 90. A violência no Brasil chegou num nível em que a sociedade começou a cobrar uma ação mais efetiva do Estado, como a nossa educação, como a política social.

Talvez a dificuldade seja que, no Brasil, a gente tenha que chegar no limite para tomar as providências.

Mas este tema pode virar uma demanda social?
Está virando. Quando você fala sobre a entrega da soja nos portos, o prazo, as filas e as complexidades, isso está virando um tema. Tanto é que o governo está entrando na discussão. Aí acho que a lei de acesso a informação pode ser útil. A transparência e o acesso a informação de forma periódica e regular permite que a sociedade cobre o que ela ache importante.

Toda vez que os problemas são trazidos à luz do dia, a sociedade se manifesta, a gestão ocorre e muitas vezes os problemas melhoram.

Fonte: Folha de S. Paulo

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