O desgastado primeiro-ministro de Portugal disse que chegou a um acordo para impedir o colapso do seu governo, mas só depois de quatro dias de convulsão política terem mostrado que a estratégia da Europa para salvar seus membros mais atingidos pela crise não está funcionando.
O primeiro-ministro Pedro Passos Coelho disse que recebeu garantias ontem de que continuaria tendo o apoio do Centro Democrático e Social, o partido minoritário na sua coalizão de centro-direita, apesar de o seu líder, Paulo Portas, ter renunciado ao cargo de ministro das Relações Exteriores.
A renúncia de Portas, na terça-feira, em protesto contra a aplicação estrita das medidas de austeridade exigidas pelos credores do resgate internacional do país "foi uma decisão pessoal", disse Passos Coelho. Ele acrescentou que Portas se comprometeu a encontrar "um meio de garantir o apoio político [do seu partido] ao governo e garantir a estabilidade política do país".
Portas ou outros membros do seu partido não fizeram nenhum comentário imediato, e a concisão dos comentários do primeiro-ministro indicaram que os partidos do governo em Lisboa ainda estavam negociando uma solução para a frágil aliança. Passos Coelho conversou com repórteres depois de reuniões com Portas e com o presidente Aníbal Cavaco Silva.
"Mesmo se a coalizão não se dissolver, isso vai com certeza deixar o governo numa situação delicada", disse António Costa Pinto, cientista político da Universidade de Lisboa.
Por trás das fissuras está uma crescente frustração popular que vem ecoando pelas debilitadas economias do bloco monetário. Anos de cortes de gastos públicos e benefícios sociais estão causando recessões mais longas do que o esperado, sem trazerem as compensações prometidas.
A dívida pública dos membros da zona do euro que adotaram a austeridade continua aumentando consideravelmente, enquanto se estabilizam somente em países como a Alemanha, que não cortaram seus gastos. Uma recuperação significativa da economia — com impulso suficiente para equilibrar os orçamentos e reverter o desemprego — é vislumbrada apenas em previsões otimistas das autoridades da União Europeia.
As grandes reformas planejadas para o setor público, inclusive demissões de servidores, vão testar novamente a unidade do governo. A coalizão portuguesa de partidos deve amargar uma derrota nas eleições municipais de setembro, tornando ainda mais difícil para ela implementar medidas econômicas impopulares.
Os títulos de dívida de Portugal se recuperaram ontem. As vendas generalizadas de quarta-feira, quando pareceu que o governo poderia cair, mostrou a fragilidade do apetite dos investidores pela dívida dos países europeus em crise.
O objetivo do governo português de voltar a se financiar nos mercados quando as prestações do resgate acabarem, em junho de 2014, é agora em geral considerado inalcançável, aumentando a possibilidade de o país precisar de uma nova rodada de socorro. A dívida está subindo tão rapidamente, em vista da contração da economia, que cada vez mais economistas acreditam que o país terá que fazer uma reestruturação da dívida do resgate e também dos títulos de dívida.
Os líderes da zona do euro, desesperados por uma história de sucesso, elogiaram Portugal no passado, assim como a Irlanda, por implementarem completamente as duras reformas econômicas que eram as condições para o resgate da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional. Por outro lado, a Europa está aumentando a pressão sobre os recalcitrantes políticos da Grécia para que acelerem as reformas se quiserem continuar recebendo ajuda.
Mas mesmo as iniciativas exemplares não estão dando resultado. A economia da Irlanda mergulhou de novo em uma recessão, da qual Portugal nunca logrou escapar. A outrora aceitação das reformas dolorosas pelos cidadãos portugueses está dando lugar a um questionamento cada vez mais generalizado sobre a capacidade do país de prosperar dentro da zona do euro.
O FMI, que ajudou a elaborar o programa de resgate de Portugal, alertou sobre os problemas que o país tem pela frente num relatório de junho, observando: "O sólido consenso social e político que até agora amparou o programa enfraqueceu substancialmente. A recuperação econômica está se mostrando difícil."
Os limitados resultados de anos de um doloroso aperto de cintos estão ressaltando o maior equívoco do plano da Europa para solucionar a crise de dívida, dizem muitos economistas. Os países credores, liderados pela Alemanha, colocaram o ônus de resolver a crise sobre as economias devedoras, pressionando-as a cortar gastos públicos e os salários do funcionalismo, enquanto não faziam nada para aumentar a demanda na economia europeia.
"O maior problema é a falta de políticas compensatórias em outros lugares. Ninguém vê [a zona do euro] como um todo" diz Paul De Grauwe, professor de economia política da Faculdade de Economia de Londres. A demanda enfraquecida por bens e serviços na Europa ajudou a minar a recuperação da economia da zona do euro depois da crise financeira global de 2008, fazendo com que ela se contraísse pelos seis últimos trimestres. Espera-se que atividade se estabilize, mas só um pouco acima do nível de recessão profunda.
Na Alemanha, que está crescendo pouco, mas tem uma taxa de desemprego baixa e um orçamento equilibrado, o governo da chanceler Angela Merkel é altamente resistente a trocar as medidas de aperto dos gastos por outras de estímulo lideradas pelos países credores.
A combinação de estagnação no norte da Europa e austeridade no sul significa a continuação de uma "tendência deflacionária" que vai levar a mais agitação política como a que ocorre em Portugal, diz De Grauwe. "Essa é a estratégia que faz as pessoas sofrerem. Vai chegar um ponto em que os sistemas políticos não vão mais aguentar", disse ele.
Fonte: The Wall Street Journal
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