Empresas chinesas estão procurando aumentar seus investimentos na América Latina e expandir-se para além do seu foco tradicional em mineração e recursos naturais — uma virada que, segundo especialistas, pode ser necessária se a China quiser evitar tensões na região.
Na África, em especial, a China tem sido criticada por canalizar grande parte de seus investimentos para a extração de recursos naturais, por importar trabalhadores chineses para a construção de infraestrutura e por inundar os mercados locais com produtos baratos.
A preocupação agora é que uma tendência semelhante possa surgir na América Latina. "A China consegue o que ela quer, mas a América Latina não pensa assim", disse Wu Guoping, diretor-assistente do Instituto de Estudos Latino-Americanos da Academia Chinesa de Ciências Sociais, em uma conferência esta semana sobre o investimento chinês na América Latina.
Alertando que os fluxos de comércio e investimentos entre a China e América Latina não são "complementares" e que implicam riscos, ele acrescentou: "A China tem que procurar uma nova estratégia para a América Latina".
Os investimentos chineses na América Latina subiram de US$ 7,33 bilhões em 2009 para US$ 10,54 bilhões em 2010, o número mais recente disponível. Esses investimentos, além de empréstimos cada vez mais ativos na região, deram à China maior poder de fogo em uma área há muito considerada um baluarte da influência dos Estados Unidos.
A China tem se focado sobretudo nos recursos naturais. Em 2010, a estatal chinesa Petrochemical Corp., ou Sinopec, comprou 40% da divisão brasileira da Repsol YPF SA por US$ 7,1 bilhões, em uma das maiores aquisições petrolíferas já feitas pela China.
Mas a China está à procura de novos mercados para fabricar e vender produtos mais sofisticados, como carros e equipamentos para geração de energia. Ela também poderia ajudar a evitar tensões como as que estão ocorrendo com países africanos — um tema de discussões em uma visita de líderes africanos a Pequim em julho.
Durante uma viagem à América Latina em junho, o primeiro-ministro chinês Wen Jiabao propôs a criação de um fundo de cooperação de US$ 5 bilhões para investimentos em infraestrutura, além de uma linha de crédito de US$ 10 bilhões para apoiar as indústrias de construção e infraestrutura da região.
Liu Xia, autoridade para investimentos no exterior da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, a instituição chinesa mais elevada de planejamento econômico, reiterou a promessa da China de diversificar os investimentos de modo a incluir infraestrutura, indústria, agronegócio e manejo florestal. "Aumentar o investimento em infraestrutura vai ajudar a melhorar a qualidade das nossas indústrias", disse Liu, acrescentando que a relação China—América Latina se tornaria ainda "mais crucial" com o tempo.
Enoque Flausino, da firma paulista de fusões e aquisições Serfinan, disse que a recente decisão do Lenovo Group Ltd. de comprar o grupo brasileiro CCE, fabricante de eletrônicos de consumo, por US$ 147 milhões em dinheiro e ações, era motivo de otimismo. "Queremos ver a aquisição como um novo sinal de que há investimentos chineses em setores mais amplos, como bens de consumo", disse ele.
Flausino estimou que há cerca de um negócio por mês, em média, sendo realizado com investimentos chineses na região, variando em valor entre US$ 200 milhões e US$ 300 milhões por negócio. Cerca de 40% se realizaram no Brasil e a maioria continua envolvendo recursos naturais.
A montadora chinesa Foton Motor Co. vai investir US$ 300 milhões para construir uma fábrica de automóveis na Bahia, informou o governo do Estado na terça-feira.
A XCMG Construction Machinery Co. Ltd. está montando duas fábricas no Brasil, mercado onde suas vendas anuais atingiram US$ 200 milhões no ano passado, e diz que está considerando construir mais fábricas em outros países latino-americanos.
A Weichai Power Co. também está explorando oportunidades, incluindo a fabricação de veículos comerciais na região. O Shanghai Electric Power Generation Group, que atualmente fornece equipamentos de geração de energia, quer passar a construir e possivelmente operar usinas de energia em mercados que podem incluir Equador, Chile, Colômbia e Peru.
Contudo, nem todos aprovam os investimentos das companhias chinesas na região. Os fabricantes brasileiros estão especialmente preocupados com a perspectiva de mais atividade chinesa na área, disse June Teufel Dreyer, professora de ciência política na Universidade de Miami.
"Os sapatos fabricados na China estão tomando espaço da indústria de calçados brasileira, e os carros chineses têm potencial para levar à falência as montadoras brasileiras", disse ela. "Mesmo assim, trata-se de saber quem leva vantagem. Muitos vendedores de matérias-primas estão muito felizes por terem o mercado chinês."
Fonte: The Wall Street Journal
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