O iminente debate no Congresso americano sobre uma possível intervenção militar dos Estados Unidos na Síria pode se tornar mais um obstáculo à retomada do crescimento global, mantendo os preços do petróleo elevados e pesando sobre os consumidores, as empresas e governos durante semanas.
Nas últimas décadas, a possibilidade de uma ação militar dos EUA no Oriente Médio sempre teve a tendência de elevar as preocupações nos mercados — em especial, aumentando os preços do petróleo — em antecipação a qualquer operação. Essas preocupações muitas vezes diminuíram rapidamente logo depois de a ação militar começar, com a subsequente queda nos custos do petróleo e o alívio nas bolsas servindo, na verdade, para impulsionar a economia.
O debate no Congresso e a votação sobre a possibilidade de um ataque militar contra a Síria, uma mudança de rumo que o presidente Barack Obama anunciou no sábado, contribuirá para que setembro seja um período potencialmente volátil.
Em um mês que marca o quinto aniversário da crise financeira mundial, os EUA agora enfrentam um debate sobre essa ação militar, além de batalhas orçamentárias para evitar uma paralisação do governo em 1º de outubro e a abertura de um debate sobre o aumento do teto de endividamento do governo antes do prazo limite de meados de outubro.
Ao mesmo tempo, autoridades do Federal Reserve, o banco central americano, vão decidir sobre uma redução do seu programa de compra de títulos, atualmente de US$ 85 bilhões por mês, numa reunião em 17-18 setembro. A simples perspectiva de que o Fed venha a tomar essa decisão já elevou os juros das hipotecas e outras aplicações de longo prazo e provocou tumulto nos mercados emergentes.
Além disso, as eleições de 22 de setembro na Alemanha, a maior economia da Europa, terão implicações para a zona do euro, que há muito está em dificuldades. Decisões cruciais, incluindo outro resgate para a Grécia, foram adiadas até depois das eleições.
Tudo isso ocorre num momento em que a economia mundial tem dificuldades para se acelerar depois de anos de lentidão.
"A economia global continua recuperando a saúde, mas o crescimento é lento e está demorando muito para voltar aos trilhos", disse Bill Adams, economista internacional sênior do PNC Financial Services Group PNC -0.43% . "O impulso está ganhando força de forma muito irregular".
Temores de um conflito no Oriente Médio muitas vezes levam os operadores de petróleo a elevar os preços nos mercados de futuros, e a expectativa de um ataque à Síria liderado pelos EUA não é exceção. O preço do petróleo subiu para um pico de dois anos na semana passada, sendo negociado a mais de US$ 110 por barril em Nova York antes de recuar, e contribuiu para oscilações bruscas nos mercados de renda fixa.
Os preços da gasolina no varejo nos EUA têm refletido a alta do petróleo. Um galão de gasolina regular (3,8 litros) custava em média US$ 3,59 no sábado em todo o país, US$ 0,05 a mais que uma semana antes, embora ainda abaixo dos preços no mesmo período do ano passado, segundo o grupo de viagens AAA. Os analistas preveem que o preço da gasolina suba lentamente em resposta ao aumento dos preços do petróleo bruto.
Economistas do JP Morgan Chase JPM -0.34% escreveram na sexta-feira, em seu boletim semanal aos clientes, que, se sustentado, o aumento de 10% no preço do petróleo nos últimos três meses poderia reduzir em até 0,3 ponto percentual a taxa de crescimento global anualizada no segundo semestre.
"Estamos presumindo que qualquer intervenção militar por parte dos países ocidentais seria suficientemente controlada de forma a não levar a uma escalada do conflito, não só dentro da Síria, mas também nos países vizinhos" escreveram eles. "E, embora se possa argumentar que parte do aumento de preços em junho e julho reflete uma melhoria do setor industrial global, um pico ainda maior nos preços representa um risco."
As exportações de petróleo da Síria são insignificantes, mas o Oriente Médio fornece um terço da produção mundial de petróleo. Qualquer conflito que venha a se alastrar para além das fronteiras da Síria representaria uma ameaça para as principais instalações petrolíferas na região. Alguns produtores de petróleo, incluindo o Irã, já ameaçaram retaliar contra os EUA e seus aliados se eles realmente atacarem a Síria.
A reação dos mercados durante as ações militares americanas anteriores contra grandes produtores petrolíferos do Oriente Médio, ou em regiões próximas a eles, mostra que o medo do tumulto muitas vezes se revela pior do que os eventos em si.
Dois anos atrás, os preços do petróleo subiram de menos de US$ 85 por barril em Nova York para mais de US$ 110 logo antes dos ataques aéreos à Líbia de março de 2011, realizados por uma coalisão que incluía os EUA. Logo após o início dos ataques, os preços do petróleo tomaram o sentido oposto e as ações subiram.
Os preparativos para a invasão do Iraque pelos EUA em 2003 provocaram reações semelhantes no mercado, com muitas empresas reclamando com antecedência sobre a incerteza causada pela espera de uma guerra.
Também em 1990 o petróleo subiu e as ações caíram depois que o Iraque invadiu o Kuwait. A operação de janeiro 1991, liderada pelos EUA, para expulsar as forças iraquianas do país causou alívio em ambos os mercados.
Os analistas esperam um alívio semelhante nos mercados de petróleo após uma ação na Síria. Depois de um esperado ataque americano nesse país, "acreditamos que os preços podem cair abruptamente, pois a probabilidade de uma resposta violenta da Síria, Irã ou Rússia é considerada baixa, e a queda real no abastecimento deve permanecer pequena", disseram economistas do Citigroup C -0.29% em uma nota recente aos clientes. "Contudo, fatores imprevisíveis pesam fortemente no mercado, por boas razões."
Com as principais economias já enfrentando dificuldades, quaisquer surpresas no Oriente Médio vinculadas a uma intervenção internacional podem precipitar oscilações mais fortes nos mercados de ações, títulos e combustíveis.
Nos EUA, a economia vem avançando a um ritmo moderado, mas há sinais de que o atual trimestre será fraco. Uma pesquisa da Universidade de Michigan sobre a confiança do consumidor, divulgada na sexta-feira, mostrou uma queda nesse índice em agosto em relação ao mês anterior, declínio que pode piorar se os preços da gasolina subirem e os consumidores ficarem preocupados com foco contínuo na situação da Síria. O aumento dos juros e a desaceleração no crescimento do consumo também apresentam riscos para a economia.
Na Europa, a zona do euro saiu da sua longa recessão no segundo trimestre. Mas o consenso é de que o crescimento permanecerá fraco nos próximos meses, enquanto há decisões políticas importantes a serem tomadas e países combalidos tentam fazer difíceis ajustes em suas economias.
Já os mercados emergentes estão sob a intensa pressão das fases mais recentes de uma recuperação global prolongada. O crescimento tem recuado nas principais economias em desenvolvimento, do Brasil à Índia, com a perspectiva de uma mudança de política do banco central americano agravando um êxodo dos investidores nas últimas semanas.
Fonte: The Wall Street Journal
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