Após semanas de discussão, em agosto, a Junta Orçamentária do governo combinou reservadamente o que parecia impossível: a meta fiscal para 2014 seria de 1,8% do Produto Interno Bruto.
A decisão da mais poderosa instância interministerial da área econômica era uma derrota do seu titular principal, Guido Mantega (Fazenda), que divide cadeira com Casa Civil e o Planejamento.
Ali, enquanto Miriam Belchior (Plenajamento) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil) defendiam um superavit primário mais em linha com o baixo crescimento e a necessidade de investimentos, Mantega batia o pé para emitir sinais de austeridade fiscal.
Houve consenso na meta fixada para União, de 1,1%, mas divergências duras quanto ao objetivo a ser perseguido por Estados e municípios.
Havia, naquele momento, a percepção de parte do grupo que, dificilmente, as unidades da federação conseguiriam atingir meta maior que 0,7% do PIB em termos de economia para o pagamento de juros de suas dívidas.
Portanto, era inútil forçar. O argumento era que o Executivo precisava poupar mais na bonança e gastar mais em intervalos de dificuldade -uma política anticíclica.
Para surpresa dos demais, dias depois Mantega anunciava um superavit primário de 2,1%, ou R$ 109,4 bilhões.
Nas tabelas oficiais, 0,7% do PIB para prefeituras e Estados virou 1%. O clima, disseram interlocutores, azedou.
Nos bastidores, Mantega foi acusado de fazer um "gol de mão" para conter o caixa do governo. "Isso não se faz", reagiu um auxiliar presidencial ao saber da confusão.
A Folha apurou que as duas ministras ficaram irritadas e tiraram satisfação. Mas os 2,1% prevaleceram.
Procurados, os ministérios da Casa Civil e do Planejamento negaram a informação por meio de suas assessorias. Mantega, também por meio de seus assessores, afirmou que a decisão "foi tomada em conjunto" com as ministras.
Nos bastidores, ministros, secretários e assessores brincam que, ao contrário do que era sob Luiz Inácio Lula da Silva, Mantega virou o "fiscalista" do governo sob Dilma Rousseff. E acrescentam: na gestão anterior, o país crescia a 4% ao ano, em média, enquanto a estimativa atual é que o ritmo caia à metade.
Mantega quereria tentar evitar que se consolidasse no mercado a sensação de que a política fiscal ia na contramão da alta dos juros promovida pelo Banco Central para conter avanço nos preços.
Não à toa, menos de um mês após o anúncio da meta fiscal para 2014, os diretores do BC mudaram a avaliação do impacto do resultado fiscal no controle da inflação.
Na ata da última reunião do Copom (o comitê que define a taxa de juros), ela passou de "expansionista" para "neutra". Não convenceram o mercado, e a equipe econômica segue administrando uma crise de credibilidade
Fonte: Folha de S. Paulo
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