A globalização das últimas três décadas reconfigurou o crescimento econômico no mundo e abriu canais importantíssimos para que economias emergentes se aproximassem dos países desenvolvidos.
O Brasil participou apenas marginalmente desse jogo e não conquistou como devia o seu espaço no novo mapa mundial da produção e dos avanços tecnológicos. Várias de suas empresas, no entanto, tiveram marcantes experiências de internacionalização e são reconhecidas como referências em seus campos de atuação.
É nesse contexto que deve ser analisada a legislação proposta pelo governo para a tributação dos lucros das empresas brasileiras no exterior. O projeto pretende defender a base tributária do país, adotando apenas alguns pontos que favorecem a internacionalização de nossas companhias.
Ora, o que se espera de uma nova regulação sobre um tema em que o país acumula significativo atraso diante de outras nações é que ela não cause um afastamento ainda maior. Na verdade, tal reforma deveria ter o firme propósito de contribuir para remover a distância que nos separa de nossos concorrentes.
É preciso deixar claro que o atual "deficit" na competição externa de nossas empresas é um destacado fator que limita o desenvolvimento interno dos padrões de qualidade, de governança, de produtividade e de inovação vigentes na economia global. Por isso, precisamos redesenhar a estratégia de desenvolvimento e perseguir com tenacidade ainda maior a internacionalização dos grupos empresariais. A propósito, nada disso passa por eleger campeões nacionais.
O principal entrave do novo projeto à internacionalização das companhias brasileiras reside na proibição da "consolidação vertical de resultados" (isto é, a compensação do prejuízo em determinado país com o lucro em outro país), uma providência defendida pelo governo para evitar o planejamento tributário e a erosão da base fiscal.
A consolidação vertical não é sinônimo de renúncia tributária, pois só permite um alívio momentâneo sobre o caixa das empresas no exterior. Esse instrumento pode acelerar a internacionalização, já que o investimento de nossas empresas fora do Brasil é financiado praticamente com recursos do caixa. Além disso, prejuízos em anos iniciais de operação em novos mercados é ocorrência usual. Assim, a compensação de resultados estimula o autofinanciamento e, por consequência, incentiva o crescimento dos negócios no exterior.
Em suma, o dilema está no seguinte fato: ao buscar maior controle sobre o resultado das empresas internacionalizadas, o governo acaba inibindo a integração da economia ao cenário global, com prejuízos para o seu próprio desenvolvimento produtivo e tecnológico.
A solução do impasse não está em proibir, mas em regulamentar adequadamente e limitar o acesso à consolidação apenas dos resultados operacionais obtidos em países que não são paraísos fiscais e que mantêm acordos de informações com a Receita Federal. Ademais, as contas das empresas no exterior devem ter total transparência.
Para não submetê-las a regimes tributários desvantajosos diante de seus competidores, a compensação de resultados poderia ser admitida em um prazo razoavelmente longo, como 15 anos, durante o qual se espera o fortalecimento das empresas brasileiras.
Há um debate entre as economias desenvolvidas sobre a necessidade de rever a legislação atual, que facilita a erosão fiscal nos países de origem das grandes empresas internacionais.
Dado o estágio diferente de nossa economia, não cabe ao Brasil antecipar-se e adotar medidas que dificultem sua internacionalização. Se e quando os demais países vierem a modificá-la, aí, sim, sem prejuízo de salvaguardas que podem ser adotadas desde já, seria o caso de nos adaptarmos ao novo marco legal internacional.
Fonte: Folha de S. Paulo
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