Apesar de a Síria não figurar entre os principais parceiros comerciais do Brasil, uma eventual intervenção militar no país, liderada pelos Estados Unidos, poderia ter um impacto negativo sobre a economia brasileira, adiando a retomada esperada pelo governo.
A opinião é de especialistas ouvidos pela BBC Brasil. Eles ressalvam, entretanto, que a intensidade desse revés dependerá da duração e da extensão do ataque ao país do Oriente Médio.
Em 2011, quando teve início o levante contra o presidente Bashar al-Assad, a Síria era apenas o 41º maior parceiro comercial do Brasil.
Ainda assim, segundo os especialistas, a economia brasileira não ficaria imune a um possível contágio de um conflito no país, que viria, principalmente, de um aumento na cotação internacional do petróleo.
Embora não seja um grande produtor da matéria-prima (ocupa a 32º posição, segundo um ranking global produzido pela Agência de Energia Internacional), a Síria possui uma localização geopolítica importante no Oriente Médio.
"A Síria está muito próxima de grandes produtores de petróleo, como a Arábia Saudita, o Irã e o Iraque. Uma intervenção militar no país poderia evoluir para um conflito regional", diz à BBC Brasil Creomar de Souza, professor de Relações Internacionais da Universidade Católica de Brasília.
"A escalada do confronto poderia reduzir a oferta dessa matéria-prima e isso se refletiria em um aumento dos preços em nível internacional", acrescenta.
Souza ressalta que tal quadro tenderia a se agravar com a proximidade do inverno no Hemisfério Norte, no final do ano, quando a demanda por petróleo para calefação costuma aumentar.
Custos maiores
"Com o petróleo mais caro, o custo da energia sobe, o que prejudica diversos setores da economia", avalia Heni Ozi Cukier, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) de São Paulo.
"Se o combustível para o transporte de mercadorias aumenta, por exemplo, os produtos também ficam mais caros", acrescenta.
Cukier lembra ainda que o aumento da cotação internacional do petróleo reduziria a competitividade da economia chinesa, essencialmente exportadora. Uma retração na atividade econômica da China, por sua vez, ameaçaria a incipiente recuperação da economia mundial.
"Para o Brasil, os efeitos seriam mais nocivos porque a China é o nosso principal parceiro comercial", afirma Cukier.
De acordo com os especialistas, um eventual aumento na cotação internacional do petróleo também elevaria a pressão por um reajuste no preço dos combustíveis no Brasil, atualmente controlado pela Petrobras.
Hoje, para suprir a demanda interna, a estatal importa petróleo a preços de mercado e vende mais barato localmente.
O adiamento do repasse aos consumidores vem causando um rombo nas contas da empresa, que poderia ser ampliado caso um conflito na Síria estoure, lembram os especialistas.
Por outro lado, destacam eles, um reajuste no preço dos combustíveis, se concretizado, poderia impactar negativamente o controle da inflação, que já está próxima da meta determinada pelo governo (6,5%).
"Mas para garantir a saúde financeira da empresa, essa conta terá de ser paga pelo consumidor, mais cedo ou mais tarde", diz Souza.
Efeito rebote
Além de pagar mais pelo petróleo, o Brasil também poderia sofrer "um efeito rebote" por causa de uma nova incursão militar dos EUA no Oriente Médio.
"Um novo confronto armado agravaria o endividamento público dos Estados Unidos, o que restringiria ainda mais os gastos do governo. Essa limitação seria prejudicial em um momento em que a atividade econômica dos EUA começa a dar os primeiros sinais de recuperação", afirma Creomar de Souza, da Universidade Católica de Brasília.
Neste sentido, uma retração da economia nos EUA poderia contaminar o restante do mundo, ameaçando a retomada da atividade econômica global, destacam os especialistas.
Em última instância, poderia haver ainda uma intensificação da migração de recursos do Brasil – bem como de outros emergentes - para ativos mais seguros, como o dólar ou o ouro.
"Essa saída de investimentos já vem ocorrendo diante da perspectiva de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) reduza os estímulos à economia e tende a se fortalecer caso o conflito se agrave", diz Cukier, da ESPM.
Investidores são avessos a riscos e costumam, em momentos de grande instabilidade internacional, buscar investimentos mais seguros, como títulos de dívida do Tesouro americano, em detrimento de aplicações em bolsa de valores, especialmente dos emergentes.
Uma eventual fuga maciça de recursos valorizaria ainda mais a moeda americana frente ao real, o que encareceria os importados e impactaria negativamente a inflação.
"Diante de tal cenário, a economia brasileira poderia crescer menos", avalia Cukier.
Cenário internacional
Na segunda-feira, em entrevista à rede de TV americana NBC, o presidente dos EUA, Barack Obama, descreveu como um "avanço" a proposta de que o governo de Bashar al-Assad coloque as supostas armas químicas sob controle internacional para serem destruídas.
A sugestão havia sido dada pelo secretário de Estado americano, John Kerry, e posteriormente endossada pelo chanceler russo, Sergei Lavrov, para evitar uma intervenção militar dos EUA no país.
No mesmo dia, o Senado americano adiou para quarta-feira a votação sobre a intervenção militar na Síria.
Obama já havia demonstrado ser a favor de uma ação no país, inicialmente sem o uso de forças terrestres. Ele aguarda, no entanto, o aval do Congresso para dar sinal verde à ofensiva.
Fonte: BBC Brasil
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