Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

domingo, 21 de outubro de 2012

Uma Coreia dentro do Brasil

Proposta paranaense de regulamentação da Lei de Inovação prevê modelo sul-coreano para o estado

Colocar ao menos metade dos mestres dentro das indústrias, dobrar o investimento em inovação e levar a produção acadêmica ao mercado. Os objetivos centrais da recém aprovada Lei de Inovação do Paraná se espelham na mesma receita que fez a Coreia do Sul saltar mais de 20 posições no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano e a economia do país crescer cerca de 9% ao ano em dez anos, entre 1983 e 1993. Para que esses objetivos sejam colocados em prática, no entanto, institutos de tecnologia e iniciativa privada têm de lutar por uma regulamentação ousada.

Antes de tudo, é preciso chegar a um consenso com o governo estadual sobre quanto dinheiro público será destinado ao fundo de inovação e quais serão as regras para a inserção de pesquisadores nas empresas.


“São pontos fundamentais para que a pesquisa saia da prateleira da universidade para a empresa e chegue à sociedade”, explica o diretor executivo da Agência de Inovação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), professor Emerson Camargo. De acordo com o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), a cada mil projetos de pesquisa básica desenvolvidos no Brasil, apenas um é aproveitado pelo mercado.

O caso sul-coreano é visto como um exemplo a seguir para o gerente de inovação da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep), Filipe Cassapo. Ele explica que os asiáticos aumentaram o investimento público e privado em inovação e aproximaram a indústria da universidade. Hoje o país tem 77% dos seus mestres e doutores trabalhando na iniciativa privada e 3,6% do PIB são investidos em inovação. No Brasil, a proporção é de 27% dos pesquisadores trabalhando nas empresas e 1,1% do PIB destinado à inovação. Ele explica que, para se tornar referência, o Paraná precisa que pelo menos metade dos seus doutores levem seus estudos para a indústria e que governo e empresas invistam o dobro em pesquisa e tecnologia. “Precisamos de uma regulamentação que permita essa mudança de patamar”, diz.

Maior valor

Segundo dados do Banco Mundial uma tonelada de produtos exportados do Brasil para a China custa, em média, R$ 60. Na Coreia, a mesma quantidade é vendida por R$ 2 mil. “Eles se baseiam em produtos de alto valor agregado, enquanto nós dependemos essencialmente de commodities. Precisamos enviar muitos navios de soja brasileira para receber um navio de tablets coreanos”, afirma Cassapo.

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apenas 1,7% das indústrias investem continuamente em inovação, mas elas são responsáveis por 25,9% do faturamento industrial e por 13,2% do emprego gerado no setor.

Celeridade

Para que possa ser sancionada e colocada em prática no começo de 2013, a proposta de regulamentação deve ser apresentada ao governo estadual até 15 de novembro. “O estado não pode esperar mais. Nós perdemos competitividade sem inovação. Temos um mês para chegar a um consenso entre quanto o governo pode abrir mão e o quanto as empresas podem se comprometer a investir”, explica o presidente do Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), Júlio Felix.

Os termos regulatórios devem propor como vai ser a renúncia fiscal das empresas que investirem em pesquisa, quais as alíquotas de impostos estarão envolvidas e como será a alimentação estatal do fundo de inovação, ao qual a iniciativa privada terá acesso para financiar suas pesquisas.

Sem incentivo legal, inovação depende de iniciativas isoladas

Enquanto a Lei de Inovação não entra em vigor, os estudos feitos nas universidades dependem de empreitadas isoladas para que cheguem ao mercado. Das mais de 9 mil empresas industriais existentes no Paraná, somente 336 investem continuamente em inovação, de acordo com a Pesquisa de Inovação Tecnológica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Esse foi o caso de Leonardo Rodrigues da Silva, inventor do BioFeed, um aparelho que avalia a execução dos movimentos do corpo e o progresso dos tratamentos de fisioterapia. O pesquisador passou dez anos na universidade estudando sistemas de eletroestimulação. Sem oportunidades no Brasil, em 2002 recebeu uma proposta para desenvolver seu invento na Áustria, mas rejeitou. “Fiquei e resolvi abrir meu próprio negócio”, relembra.

Sem qualquer amparo legal, em três anos e meio desenvolveu o aparelho e colocou no mercado. “O mais difícil de enfrentar essa empreitada sozinho, como eu fiz, é saber entrar no mercado. A experiência de uma empresa do ramo é fundamental”, afirma o pesquisador, admitindo que o ideal seria que o ambiente acadêmico tivesse mais proximidade com a iniciativa privada.



Para viabilizar o BioFeed, o engenheiro recebeu ajuda de um investidor-anjo, que arcou R$ 80 mil em gastos do projeto. De resto, Leonardo bancou mais de R$ 300 mil do próprio bolso.

A experiência do primeiro invento levou o pesquisador a lançar seu segundo projeto ao mercado: o MovSmart, que indica quais os melhores treinos e exercícios na academia para cada pessoa. “Aprendi a me planejar mais, estudar melhor o mercado e entender a dinâmica da comercialização da patente”, admite ele, que hoje é proprietário da BioSmart, empresa que trabalha na criação de sistemas de reabilitação.

Segundo Rodrigo Martins, presidente do Conselho de Política Industrial, Inovação e Design da Fiep, são as pequenas e médias empresas, como a de Leonardo, que serão privilegiadas pela Lei de Inovação. “As empresas poderão compartilhar os laboratórios e aparelhos das instituições de pesquisa para desenvolver tecnologia”, afirma.


Pontos-chave
A Lei de Inovação foi aprovada, mas agora é preciso regulamentá-la. Entenda os principais pontos em discussão entre governo, academia e empresas:
Funcionamento do fundo
Um fundo com recursos estatais e privados ficará à disposição das instituições de pesquisa e empresas. É preciso definir como será a participação do governo – quanto do PIB será destinado ao fundo, qual será a renúncia fiscal das empresas que participarem e quais as alíquotas.
Relação entre instituições de pesquisa e iniciativa privada
Serão definidas as condições em que pesquisadores poderão se licenciar de seus cargos em universidades públicas para colaborar em projetos da iniciativa privada e qual a participação destes profissionais no retorno financeiro dos inventos.
Participação das MPEs
A lei prevê que os recursos sejam destinados às pequenas empresas locais prioritariamente para incentivar a inovação regional, no entanto, a regulamentação é que vai determinar de que forma estas empresas terão acesso aos recursos. Outro ponto a ser definido é a forma de utilização dos laboratórios compartilhados dos institutos de pesquisa.


Fonte: Gazeta do Povo

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