Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

“Precisamos libertar o país do superávit primário”


Consultor e economista Eduardo Teixeira vê na retomada dos gastos do governo em projetos de infraestrutura a única saída viável para o Brasil retomar o crescimento.

Ex-presidente da Petrobras e ex-ministro da Infraestrutura durante a gestão de Fernando Collor na Presidência da República, Eduardo Teixeira olha para as duas décadas vividas pelo Brasil desde sua saída do governo com muito otimismo, especialmente se a ótica for a do nível de emprego e da inserção dos brasileiros.

Pondera, porém, que o país chegou a um momento de estagnação do crescimento econômico do qual só conseguirá sair se houver um pesado investimento por parte da União em projetos de infraestrutura.

A saída para tornar viável esses aportes, segundo o economista, estaria na redução das metas de superávit primário. Para Teixeira, há pouco sentido no fato de o Brasil pretender atingir entre 3% e 4% de superávit primário em um cenário de crise internacional e inflação controlada no país.

"No Brasil temos retração do crescimento econômico, mas não recessão, como ocorre em outros países. E a forma de combater essa crise - num momento em que as expectativas empresariais estão deprimidas - é o investimento público. No marco do sistema capitalista não há outra saída. Estamos vivendo uma situação na qual a única maneira de a economia voltar a crescer é o setor público gastar."

Há espaço para essa iniciativa, conforme Teixeira aponta, especialmente em razão do processo iniciado pela contínua queda dos juros.

"Temos que aproveitar este momento em que as taxas de juros estão caindo e, portanto, os encargos financeiros do setor público também se retraem".

A dificuldade estaria em tomar decisões políticas nesta direção e, ao mesmo tempo, garantir que essa verba retirada das reservas fosse realmente direcionada à infraestrutura. "A questão mais complicada é evitar que esse dinheiro escape para gasto de custeio".

Quanto a uma resposta ao discurso de quem defende a manutenção das taxas de superávit primário, o economista propõe a "libertação da ditadura do superávit", já que as condições macroeconômicas mudaram ao mesmo tempo em que o Brasil precisa de um movimento para animar sua economia.

"Nós ficamos prisioneiros dessa discussão muito tempo porque tínhamos uma situação fiscal e de modo geral macroeconômica muito frágil. Mas isso acabou."

"A inflação está baixa há muitos anos e o Brasil tem cerca de US$ 375 bilhões em reservas. Tem mais reservas do que em tese seria necessário. Então, não temos fragilidades externas, ou tampouco nas contas internas."

"Para que vamos continuar fazendo superávit primário como fazíamos quando tínhamos essas fragilidades?"

Apesar de ter, afinal, se desentendido com o ex-presidente - o que ocasionou sua saída do governo -, Teixeira destaca a importância do papel de Collor para o avanço no cenário econômico nacional.

"Se a economia brasileira é o que é hoje isso se deve ao Collor. Foi ele quem promoveu a abertura econômica, tornou viáveis as privatizações e enfrentou o mercado financeiro. Só que ele não tinha apoio do Congresso. E o Executivo não consegue governar sem o Congresso no Brasil."

O senhor tem uma proposta para promover o aumento dos investimentos na área de infraestrutura que vai além das concessões e das parcerias entre setores público e privado da maneira como funcionam hoje. Em que consiste essa proposta?

Eu penso que seria preciso capitalizar as empresas estaduais para que o governo seja agente ativo desse processo, especialmente em setores como o de saneamento - um serviço que ainda não chega a quase 60% da população brasileira.

Por isso, essa é uma área de necessária parceria entre o Estado e o setor privado. Só que em alguns estados há um cenário tão grave na situação do Tesouro estadual e da companhia responsável pelo serviço que fica difícil pensar em soluções sem interferência externa.

O ideal seria que houvesse também intervenção do governo federal nesses casos. Há uma linha especial para isso do Fundo de Garantia por Tempo de Serviços (FGTS) - por meio da qual o FGTS entra com aporte de capital, como sócio das empresas.

Mas essa iniciativa ainda está em estágio preliminar. Socialmente, é tão grande a necessidade de transformação da parte de esgoto, bem como a de finalizar a universalização de acesso à água, que os recursos têm que ser pensados em vários ângulos e precisamos voltar a contar com aportes da União para isso.

É viável, hoje, a União voltar a ter essa participação?

Depende. Se você defende superávit primário de 3% a 4%, fica mais difícil. Minha tese é que temos de cortar rapidamente o superávit primário.

No Brasil temos retração do crescimento econômico, mas não recessão, como ocorre em outros países. E a forma de combater essa crise - num momento em que as expectativas empresariais estão deprimidas - é o investimento público. No marco do sistema capitalista não há outra saída.

Estamos vivendo uma situação na qual a única maneira de a economia voltar a crescer é o setor público gastar. Mas não é gastar em custeio. É gastar em investimento.

Há condições econômicas para esse tipo de decisão?

A necessidade do gasto está posta na mesa. O Brasil precisa resolver rapidamente inúmeras questões de infraestrutura.

Então, temos que ter coragem de enfrentar o seguinte debate: tem sentido buscar superávit primário num mundo em que não há inflação alta - só em um ou outro país com situações muito específicas - e que vive uma crise de redução dramática de crescimento?

A prioridade claramente é voltar a crescer. No caso brasileiro, nós temos que aproveitar este momento em que as taxas de juros estão caindo e, portanto, os encargos financeiros do setor público também se retraem.

Esse cenário permite diminuir o superávit primário com a finalidade de aumentar o investimento. Não tem sentido no meio de uma crise como essa manter um superávit primário de 3% ou 4%.

Não haveria fatores restritivos a essa medida?

Mais do que a necessidade dessa redução, há espaço para que ela ocorra. O fundamental para pensar nisso é olhar para o resultado nominal.

E o resultado nominal - que é o resultado primário mais o resultado dos juros pagos pelo setor público - permite isso. A situação atual aponta que esse juro pago vai cair e nosso resultado fiscal vai melhorar.

Se houver redução do primário - até mesmo aproveitando esse resultado fiscal -, há condições para fazer isso. É evidente que temos que fazer uma série de coisas, entre elas melhorar nosso sistema educacional, alterar a situação tributária, ampliar a eficiência, diminuir o custo Brasil.

Tudo isso é verdade. Mas o foco na infraestrutura também precisa estar entre essas prioridades. Não é o déficit nem a inflação o problema de um país como o nosso atualmente.

E seria uma decisão simples?

A questão mais complicada é evitar que esse dinheiro escape para gasto de custeio. É preciso desenvolver projetos transformadores de infraestrutura social e econômica.

O Brasil pede essa discussão há algum tempo, não é?

Nós ficamos prisioneiros dessa discussão muito tempo porque tínhamos uma situação fiscal e de modo geral macroeconômica muito frágil. Mas isso acabou. A inflação está baixa há muitos anos e o Brasil tem cerca de US$ 375 bilhões em reservas.

Tem mais reservas do que em tese seria necessário. Então, não temos fragilidades externas, ou tampouco nas contas internas. Para que vamos continuar fazendo superávit primário como fazíamos quando tínhamos essas fragilidades?

As condições macroeconômicas mudaram, ao mesmo tempo em que o momento que vivemos pede que a economia seja relançada.

O investimento em infraestrutura seria o grande propulsor do crescimento econômico dentro dessa lógica?

Perfeitamente. Ele é importante para ajudar a recuperação da economia, ele é socialmente justo. Essa crise abre a oportunidade de melhorar o debate.

É a chance de enfrentar as questões concretas sem preconceitos, sem se preocupar muito com o que aconteceu no passado ou ficar refém de conceitos antigos.

Tivemos, em maio, uma relação entre dívida líquida e PIB do setor público de 35%. A penca de países que tem mais de 100% é enorme. Não que eu defenda o aumento da dívida líquida...

Mas o superávit primário não tem sido colocado como uma meta a ser cumprida pelo governo? As declarações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, sinalizam essa postura muitas vezes...

Vamos libertar o ministro da Fazenda! É hora de libertar o Ministério da Fazenda da ditadura do superávit primário.

Eu não sou contra superávit primário. Se a economia estiver crescendo aceleradamente, começando a ter pressão sobre a inflação, faz sentido subir os juros e aumentar o superávit primário.

Mas nós temos o contrário. Estamos vivendo um momento em que temos inflação comportada.

Não há ainda um fantasma da inflação pairando sobre o país? O discurso do risco de retomada do crescimento da inflação está sempre presente.

Quando o Tombini (presidente do Banco Central, Alexandre Tombini) reduziu os juros no ano passado ele foi muito criticado pelo chamado mercado, que previa a possibilidade de crescimento da inflação.

O Tombini estava certo e o mercado errado, mas poucos economistas fizeram autocrítica depois.

Fonte: Brasil Econômico

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