Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Para periferia da Europa, inflação é fundamental

Bloomberg News

À medida que a economia da Europa se recupera da crise, os países mais afetados, como a Espanha e a Itália, tentam reduzir suas dívidas e se tornar mais competitivos no mercado mundial.

O problema é que é difícil fazer as duas coisas ao mesmo tempo. E a ausência de inflação na zona do euro tem dificultado ainda mais a situação.

Então, embora a elite econômica mundial, que se reuniu semana passada em Davos, na Suíça, tenha celebrado o fortalecimento da recuperação global, o mais provável é que as feridas da zona do euro levem muito tempo para cicatrizar e possam até reabrir.

Eis o porquê:

Até a crise, os países da "periferia" da zona do euro, principalmente no sul da Europa, tinham uma inflação mais alta do que a das economias "centrais" da região, na órbita da Alemanha. Os produtos dos países da periferia tornaram-se muito caros, muitas vezes levando a déficits comerciais insustentavelmente grandes pagos por empréstimos de credores estrangeiros.

Sem ter uma moeda nacional que possam desvalorizar, os países da periferia precisam empurrar para baixo preços e salários em relação ao núcleo da Europa para recuperar a competitividade. Nos próximos anos, a inflação da periferia terá que ser menor do que a média europeia.

Mas reduzir o peso de uma dívida é mais fácil para famílias, empresas e governos se sua renda nominal, que sobe junto com a inflação e o crescimento econômico, estiver se expandindo. Para manter as contas em dia — e resistir a crises financeiras futuras —, esses países precisam reduzir suas dívidas como proporção do produto interno bruto. Isso significa que quanto mais a inflação na Europa cair, maior será a tensão entre se manter solvente e aumentar a competitividade.

O Bruegel, um centro de estudos econômicos de Bruxelas sem inclinações políticas, calcula que a Espanha e a Itália podem reduzir com grande esforço a crescente proporção da dívida pública nos próximos anos caso suas economias se expandam, seus orçamentos sejam bem controlados e a inflação da zona do euro fique perto de 2% ao ano, a meta do Banco Central Europeu.

Mas se a inflação média do bloco se mantiver em apenas 1%, a necessidade de manter os preços abaixo dos da Alemanha para proteger sua competitividade empurraria a inflação da Itália e Espanha na direção de zero. Nesse caso, um PIB nominal mais baixo faria a dívida pública parecer ainda pior. A dívida da Espanha pode subir para 120% do PIB, enquanto a da Itália pode superar 140%, projeta o Bruegel.

A taxa de inflação anualizada da zona do euro já caiu para menos de 1%. Na Espanha, a inflação é praticamente inexistente, e a da Itália está cada vez menor. Mesmo a Alemanha, que precisa manter a inflação bem acima de 2% no cenário otimista do Bruegel, está abaixo da meta. Há um risco de que o cenário mais sombrio se torne realidade.

"Meu medo é que acabe sendo muito difícil para estes países alcançarem a meta dupla de sustentabilidade da dívida pública e um impulso duradouro na competitividade", afirma Zsolt Darvas, membro sênior do Bruegel.

Se os preços caírem de imediato, a Grécia é uma mostra do que pode ocorrer: a deflação tem produzido estragos na saúde financeira do país, aumentando a proporção da dívida em relação ao PIB, apesar de uma draconiana austeridade orçamentária.

Embora a Itália e a Espanha não estejam lidando com uma deflação, mesmo um cenário de inflação muito baixa pode criar um ciclo maléfico. Seria preciso mais austeridade para estabilizar as dívidas, atrasando a recuperação. E se a renda nominal decepcionar, as famílias e as empresas terão de gastar mais para reduzir dívidas, ficando com menos renda disponível para consumir ou investir.

O dilema faz parte de uma série de razões pelas quais a recuperação da zona do euro provavelmente será complicada, além dos elevados custos de captação que os países da periferia enfrentam, políticas de aperto fiscal, regulamentação rígida e uma escassez generalizada de demanda.

Uma redução de dívida muito lenta também deixa as economias em dificuldades mais vulneráveis a qualquer turbulência financeira global no futuro. A dívida externa líquida do governo da Espanha e do setor privado, que chegou a quase 95 % do PIB, precisa ser refinanciada continuamente.

"A ameaça é que qualquer deslocamento do mercado financeiro, como uma parada súbita na disposição dos estrangeiros de [continuar comprando] dívida espanhola, vai gerar caos", diz Huw Pill, economista-chefe para Europa do Goldman Sachs.

A maioria dos países da periferia já recuperou alguma competitividade. Mas eles precisam avançar mais para construir superávits comerciais grandes e sustentáveis que ajudem a garantir o pagamento de sua dívida externa. Salários e preços comprimidos tornam a dívida existente mais onerosa em todos os níveis da economia. Trabalhadores espanhóis que tenham que aceitar salários menores para elevar a competitividade de seus empregadores, por exemplo, vão ter ainda mais dificuldade para manter a hipoteca em dia.

O BCE poderia ajudar ao se esforçar mais para elevar a inflação em toda a Europa, imprimindo euros e comprando ativos financeiros em grande escala. Mas o BCE não quer irritar a Alemanha, que condena o estímulo monetário. A Alemanha também poderia ajudar, ampliando investimentos e salários.

Uma demanda e inflação mais altas no núcleo facilitaria o reequilíbrio interno do bloco. E uma redução do descomunal superávit comercial da Alemanha também enfraqueceria o euro, ajudando a competitividade da periferia. Mas a Alemanha deixou claro que o sul da Europa terá de corrigir os desequilíbrios da zona do euro sozinho, com pouca ajuda do núcleo para compensar os cortes de gastos e a redução de salários.

A Europa provavelmente vai se virar de alguma maneira, como de costume, diz Darvas, do Bruegel. Mas sem mais inflação, "vai ser um processo muito mais longo e doloroso".

Fonte: The Wall Street Journal

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