Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Sobre a grande depressão da Suécia

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Durante a recente crise financeira, a Suécia emergiu como uma das poucas economias em uma posição financeiramente sólida.  Esta robusta posição do país, o que o distancia das outras nações ocidentais, faz da Suécia um interessante exemplo daquilo que poderia — ou deveria — ter sido feito. 
Com efeito, Paul Krugman, o economista laureado com o prêmio Nobel, repetidamente fala que a maneira como os suecos lidaram com sua depressão econômica ocorrida no início da década de 1990 é o motivo de seu recente sucesso.  Mais especificamente, ele fala da nacionalização de alguns bancos no momento da crise.  Embora ele enfraqueça sua análise ao se concentrar exclusivamente em um limitado conjunto de medidas de curto prazo em vez de em mudanças de longo prazo — como é a característica distintiva de um keynesiano —, Krugman de fato está correto em relação ao fato de que a Suécia adotou algumas medidas sensatas.

Em setembro de 1992, o Riksbank, o Banco Central da Suécia, elevou a taxa básica de juros para quinhentos por cento (500%) em uma vã tentativa de manter o regime de câmbio fixo da coroa sueca em relação à Unidade Monetária Europeia.  Esta medida drástica foi tomada em conjunto com um substancial corte de gastos, tudo com o objetivo de lidar com a queda livre que a economia do país estava vivenciando àquela época.  O colapso econômico foi a culminação de duas décadas inteiras de declínio econômico, e este foi o evento que alterou fundamentalmente a situação política na Suécia.

Desde então, a Suécia vem apresentando reduções consistentes da intromissão estatal em sua economia ao mesmo tempo em que vem (1) aumentando as restrições às políticas assistencialistas, (2) desregulamentando os mercados e (3) privatizando antigos monopólios governamentais.  O país instituiu uma nova estrutura geral de incentivos na sociedade, tornando o ambiente econômico mais propício ao trabalho e ao empreendedorismo.  A dívida do governo, que era de quase 75% do PIB em 1995, despencou para apenas 38% do PIB em 2012.

Em outras palavras, o país foi bem-sucedido em fazer recuar seu insustentável, porém mundialmente afamada estado de bem-estar social.  Não obstante o pensamento fantasioso de Krugman, este foi o real motivo de a Suécia ter sobrevivido à atual crise financeira.

A ascensão e a queda do estado de bem-estar

A Suécia vivenciou um século de rápido crescimento econômico, o qual durou de 1870 a 1970, e que literalmente transformou aquele que era um dos países mais pobres da Europa no quarto mais rico do mundo. 

A primeira metade deste período de crescimento foi marcada por amplas reformas pró-livre mercado, ao passo que a segunda metade se destaca pelo fato de a Suécia ter se mantido fora das duas guerras mundiais, desta forma se beneficiando ao manter intacta sua infraestrutura industrial quando o resto da Europa estava em ruínas.  Embora um arranjo assistencialista tenha sido estabelecido e expandido durante o período do pós-guerra, ele no geral havia sido construído em torno de instituições capitalistas, gerando assim um impacto limitado sobre o crescimento da economia.

No entanto, a situação política se alterou.  As décadas de 1970 e 1980 viram um estado assistencialista crescendo descontroladamente, ampliando enormemente suas áreas de intervenção.  Vários novos benefícios governamentais foram criados; leis trabalhistas extremamente rígidas foram introduzidas; setores estagnados da economia passaram a receber amplos subsídios do governo; as alíquotas de impostos sofreram aumentos drásticos, sendo que algumas alíquotas marginais chegaram a ultrapassar os 100%.  Em uma tentativa de nacionalizar completamente a economia, os löntagarfonder ("fundos de pensão de empregados") foram instituídos em 1983 com o intuito "reinvestir" os lucros de empresas privadas em ações a serem administradas pelos sindicatos.

Durante este período, os déficits orçamentários do governo explodiram e, consequentemente, a dívida do governo praticamente decuplicou de 1975 a 1985.  A Suécia também vivenciou uma alta inflação de preços (chegando a quase 16%), uma situação que foi agravada por seguidas e contínuas desvalorizações da taxa de câmbio com o intuito de estimular as exportações.  Em 1976, a taxa de câmbio da coroa em relação ao marco alemão foi desvalorizada em 3%; em 1977, em 6% no início do ano e depois em mais 10% no final do ano; em 1981, em 10%; e em 1982, em 16%.

No geral, a rápida expansão do estado assistencialista pode ser ilustrada pela proporção entre o emprego no setor público (financiado por impostos) e o emprego no setor privado: em 1970, havia 0,386 funcionário público por empregado no setor privado; em 1990, havia 1,51 funcionário público por empregado no setor privado.  A Suécia rumava ao desastre.

Explicando a Grande Depressão da Suécia

Uma explicação muito popular para o colapso da economia sueca na década de 1990 culpa a desregulamentação dos mercados financeiros ocorrida em novembro de 1985.  No entanto, nossas pesquisas (ainda em andamento) demonstram que a desregulamentação foi na realidade uma mera tentativa de resolver os crescentes problemas de financiamento do governo sueco, cuja situação financeira já estava debilitada e vinha se deteriorando anualmente.  Por exemplo, no ano fiscal 1984-85, o pagamento de juros da dívida do governo sueco foi equivalente a 29% das receitas tributárias do governo — e igual ao gasto total do governo com a seguridade social.  A insustentável situação financeira do governo sueco fez com que a desregulamentação do sistema financeiro fosse necessária.

Este acesso facilitado aos mercados financeiros fez com que uma situação desesperadora se tornasse mais sustentável.  Porém, a consequência foi que a Suécia acabou vivenciando um grande aumento na oferta de crédito.  Nossos números mostram que o volume de empréstimos bancários para empresas aumentou de 180 bilhões ao final de 1985 para 392 bilhões ao final de 1989, um aumento total de 117% — ou de 21% ao ano.  De onde veio todo esse dinheiro?  De um lado, a própria desregulamentação aumentou a demanda por crédito, a qual foi suprida pelo sistema bancário de reservas fracionárias.  Porém, dando sustentação a toda essa expansão creditícia estava o Banco Central da Suécia. 

De 1985 a 1989, o Riksbank aumentou em 975% seus empréstimos ao sistema bancário.  Adicionalmente, suas compras de títulos do governo em posse dos bancos aumentaram 36% neste mesmo período.  Isso significa que foi o próprio Banco Central sueco quem forneceu as bases para toda essa expansão creditícia.  Esse boom creditício, que gerou uma bolha imobiliária no país, foi interrompido em 1990, o que deu origem à depressão de 1990-1994.  Após uma reforma bancária, vários programas assistencialistas foram cortados e várias reformas pró-mercado foram adotadas, o que devolveu um pouco de dinamismo e eficiência à economia sueca, a qual é considerada hoje a 18ª economia mais livre do mundo, com ampla liberdade empreendedorial, de investimentos e de comércio. Mesmo o imposto de renda de pessoa jurídica, cuja alíquota máxima é de 26%, é menor que o americano [e que o brasileiro, que chega a 34%].

A Suécia é um caso interessante a ser estudado.  Realmente, como Krugman repete frequentemente, temos muito a aprender com a história do país: de sua duradoura era de crescimento econômico graças ao arranjo de livre mercado que fora adotado até a ascensão e queda do estado assistencialista.  A solidez financeira recentemente (re)adquirida e sua capacidade de resistir à recessão global se devem não a um robusto estado assistencialista, como alega Krugman, mas sim ao recuo de longo prazo do amplo assistencialismo que os keynesianos tão frequentemente louvam.

Fonte: Instituto Mises Brasil

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