Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

O Brasil corre risco de ter sua classificação de crédito rebaixada?

Bovespa | Crédito: AFP
Brasil poderia cair um degrau na classificação de crédito, dizem especialistas
Apesar de as três principais agências de classificação de risco - Standard & Poor's (S&P's), Fitch Ratings e Moody's - ainda considerarem o Brasil estável, persiste no mercado o temor de um possível rebaixamento do rating brasileiro. Mas quão real é essa expectativa?
O pessimismo foi reforçado na semana passada, após o jornal britânico Financial Times afirmar que o país poderia ser o primeiro dos Bric (grupo que reúne, além do Brasil, Rússia, China e Índia) a perder o chamado "grau de investimento", patamar equivalente ao de "bom pagador".
A classificação de crédito, ou rating, é uma espécie de selo concedido por empresas de avaliação de risco que reflete a capacidade de um país ou uma empresa de honrar seus compromissos financeiros. As notas são expressas por letras e sinais aritméticos, que indicam para um maior ou menor risco de suspensão de pagamento.
Um eventual rebaixamento da classificação de crédito do Brasil pelas agências de risco teria como principal efeito uma valorização do dólar, na opinião de especialistas ouvidos pela BBC Brasil.
Eles acreditam que a cotação poderia alcançar o teto de R$ 2,50 durante a Copa do Mundo, em junho do ano que vem; atualmente, a moeda americana vale cerca de R$ 2,30.
Na opinião desses analistas, uma revisão para baixo do rating do Brasil, caso se concretize, poderia alimentar ainda mais a desconfiança dos investidores sobre o país e fortalecer, de forma mais acentuada, a saída de divisas, já em curso, entre outros motivos, por causa do cenário macroeconômico interno e das perspectivas de mudança na política monetária dos Estados Unidos.
Com menos dólares no Brasil, a tendência da moeda americana seria de se valorizar.
"Se houver o rebaixamento do rating, o fluxo de capital para o Brasil tende a diminuir, o que gera uma perspectiva de desvalorização do real frente ao dólar", disse à BBC Brasil Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, agência de classificação de risco de origem brasileira.

Perspectiva negativa
Desde 2008, o Brasil é considerado "grau de investimento" nas três principais agências de classificação de risco (ver tabela abaixo), ou seja, considera-se que o país tem menos chance de dar calote em seus credores. Nações desenvolvidas, como Estados Unidos, Alemanha, França e Reino Unido também estão nessa categoria.
Ter "grau de investimento" permite ao país atrair divisas com mais facilidade. Inúmeros fundos de investimentos, por exemplo, possuem regras internas que impedem a aplicação de recursos em nações que não estejam dispostas nessa categoria.
Atualmente, das três principais agências, apenas a S&P's mantém o Brasil com perspectiva negativa, o que, em teoria, indicaria que um rebaixamento futuro. Para as outras duas, Fitch Ratings e Moody's, a nota do país é "estável".
Em entrevista recente ao jornal o Estado de S. Paulo, entretanto, a diretora da S&P's para a América Latina, Lisa Schineller, descartou a hipótese de rebaixamento.
Além disso, para perder o "grau de investimento", o Brasil teria que ter sua nota rebaixada duas vezes consecutivas. Essa última hipótese também foi rechaçada a curto prazo pelos economistas.

Rebaixamento de rating
O artigo do Financial Times foi baseado em um relatório da filial brasileira do banco britânico Barclays, que previu a queda de um degrau na classificação de crédito já em janeiro do ano que vem.
O estudo, assinado pelos economistas Marcelo Salomon e Bruno Rovai, atribui o rebaixamento do rating soberano à deterioração das contas públicas.
Segundo o relatório, o déficit do governo central (formado pelo governo federal, Banco Central e Previdência Social) em setembro, que somou R$ 10,4 bilhões, o pior para o mês em 17 anos e acima do previsto inicialmente pelo mercado (déficit de R$ 500 milhões), contribuiu para manter o pessimismo acerca de uma eventual redução da classificação de crédito do Brasil.
"O surpreendente baixo resultado foi principalmente propiciado por um forte aumento nos gastos extraordinários durante o mês, mas uma arrecadação abaixo da esperada também ajudou a intensificar a tendência de um déficit mais ampliado", informou o estudo.
Além disso, os economistas disseram permanecer "céticos" de que essa tendência – de gastos crescentes – possa ser revertida, especialmente considerando as eleições que ocorrerão em outubro do ano que vem.

Superávit primário
O relatório cita ainda a dificuldade de o governo atingir a meta de superávit primário ─ economia para pagar os juros da dívida - estabelecida para esse ano (2,3% da arrecadação), mesmo com as receitas extras do leilão do campo de libra (R$ 15 bilhões) e do Programa de Recuperação Fiscal (Refis).
"O ponto crítico, na nossa opinião, é a deterioração sustentável e contínua do superávit primário, que, em última análise, pode elevar os níveis de endividamento", afirmou. "(...) Acreditamos que o governo evitará tomar qualquer medida para rapidamente reduzir os gastos do governo, que, no fim das contas, poderia afetar o crescimento no ano anterior às eleições presidenciais de 2014".
O superávit primário é importante na avaliação do risco soberano de um país porque indica a capacidade dele de saldar seus compromissos financeiros. Se o governo gasta muito (ou seja, economiza pouco), reduz seu espaço de manobra para pagar suas dívidas (entre elas, os juros que remuneram os títulos públicos, uma das formas de financiamento de um governo).
"Baseamos a nossa análise no resultado fiscal do governo. A situação das contas públicas piorou depois de junho, quando já havíamos lançado o primeiro alerta. Além disso, o governo tem dado sinais claros de intervencionismo, o que aumenta a desconfiança do investidor sobre o futuro do país", afirmou Bruno Rovai, economista do Barclay's e um dos autores do estudo, à BBC Brasil.
Para Sidnei Nehme, diretor-executivo da NGO corretora, há uma percepção por parte do mercado de "fragilização da política fiscal".
"O governo não vem conseguindo obter resultados satisfatórios em sua política fiscal e tem pouca chance de se reabilitar, revertendo todas as desonerações que já fez. Além de aumentar os gastos, quando, na prática, deveria reduzi-los, também recorreu a métodos contábeis pouco ortodoxos", afirmou Nehme à BBC Brasil.
"Tudo isso é observado pelas agências de classificação de risco. Caso a política fiscal se repita nos próximos meses, é provável que o Brasil caia um nível em sua nota de rating", acrescentou ele.
"Isso poderia ter um impacto cambial, no sentido de desvalorização da nossa moeda em relação ao dólar", concluiu.

'Luz amarela'
Alex Agostini, da Austin Rating, evitou especular sobre um eventual rebaixamento do rating brasileiro, mas destacou a mudança na maneira como o Brasil é visto por investidores internacionais.
"Não há dúvida de que a luz amarela já está acesa para o Brasil. A economia brasileira vem patinando, o que significa uma arrecadação menor para o governo financiar seus gastos e honrar seus compromissos. Por outro lado, os gastos públicos não diminuíram. Com isso, o governo tem menos dinheiro para fazer investimentos e estimular a economia", explicou Agostini à BBC Brasil.
"Por outro lado, com a perspectiva de que os Estados Unidos voltem a ficar atrativos com o fim dos estímulos do Fed (o banco central americano), os investidores começam a pesar se realmente vale o risco de permanecer no Brasil", disse.
Em virtude da crise econômica iniciada após a quebra do banco Lehman Brothers, em 2008, os EUA adotaram diversas medidas para dar alento à economia, como a compra de títulos do governo (inundando a economia com dólares) e juros próximos a zero. Com a melhora dos indicadores do país, especialmente os relacionados ao emprego, a perspectiva é que esses estímulos passem a ser retirados nos próximos meses, e como resultado o país passaria a ser mais atraente para os investidores.
"Para piorar tal quadro, existe ainda uma preocupação por parte desses mesmos investidores com o grau de ingerência do governo na economia", acrescentou Agostini.

Outro lado
Em entrevista recente ao jornal O Globo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que a situação das contas públicas chegou ao seu pior momento em setembro, mas tende a melhorar.
Na ocasião, ele também disse considerar exagerada a ameaça de que o rating brasileiro seja revisto.
Para Francisco Lopreato, professor de economia da Unicamp, há muita "gritaria" em torno do quadro fiscal brasileiro.
Segundo ele, o superávit primário deve ficar abaixo da meta do governo, mas "na casa dos 2%", o que não impõe "qualquer risco" à segurança da dívida.
"Considero as análises exageradas. De fato, o quadro fiscal piorou neste ano, mas não há nada que ponha em xeque as garantias de sustentabilidade da dívida. Acredito que a economia vá se recuperar no ano que vem e o cenário será melhor", afirmou ele à BBC Brasil.

Fonte: BBC Brasil

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