Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Sem ajuda do governo, Roma corre risco de falência

A capital italiana, à beira de uma falência ao estilo de Detroit, está dando ao primeiro-ministro Matteo Renzi sua primeira grande dor de cabeça política.

No primeiro dia de seu governo, Renzi teve que retirar um decreto, promulgado por seu antecessor, que teria ajudado Roma a pagar um déficit orçamentário de 816 milhões de euros (US$ 1,17 bilhão), depois que ele foi obstruído ontem pela oposição no Parlamento, o que significa que o projeto de lei teria pouca chance de ser aprovado.

Conceber um novo decreto que forneça ajuda à Cidade Eterna agora custará a Renzi tempo e capital político que ele pretendia aplicar na promoção de grandes reformas radicais na legislação eleitoral e trabalhista durante suas primeiras semanas no cargo.
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O prefeito de Roma, Ignazio Marino, que vai trabalhar de bicicleta, tem decisões difíceis pela frente ao tentar equilibrar o orçamento da capital italiana.
Para o governo municipal de Roma, a obstrução gera consequências ainda mais difíceis. Eles têm agora que enfrentar escolhas desagradáveis – como o corte de serviços públicos, o aumento de impostos ou o atraso de pagamentos a fornecedores – para ganhar tempo enquanto procuram maneiras de fechar uma crescente lacuna orçamentária. Se falhar, a cidade poderia ser colocada sob a supervisão de um administrador encarregado de vender alguns de seus ativos mais valiosos.

"É hora de parar com os truques de contabilidade e declarar a falência de Roma", diz Guido Guidesi, um parlamentar da Liga do Norte, que lidera a oposição.

O prefeito de Roma, Ignazio Marino, um cirurgião que faz transplantes de órgãos formado nos Estados Unidos, ganhou as eleições do ano passado com a promessa de terminar com o nepotismo, melhorar os serviços básicos e impulsionar o turismo no centro da cidade com iniciativas como manter o Forum Imperial iluminado e aberto durante a noite. Em vez disso, ele tem lutado para equilibrar o orçamento. Ontem, ele indicou que não tem nenhuma intenção de liderar cortes orçamentários profundos e o presidente da câmara municipal chamou a atenção para o impacto mais amplo dos problemas financeiros de Roma.

"Uma moratória da capital da Itália provocaria uma reação em cadeia que poderia varrer toda a economia nacional", disse ontem Mirko Coratti, presidente da câmara de vereadores de Roma.

A parte central do plano do prefeito consiste em pedir uma transferência de 485 milhões de euros do governo federal para compensar Roma dos custos adicionais que incorre em seu papel como um importante destino turístico, a capital do país e a sede do Vaticano.

"Roma é única quando comparada a outras cidades" e merece o apoio do Estado por causa do grande número de visitantes que utiliza seus serviços, mas não contribui muito para a economia, disse Marino numa entrevista recente ao The Wall Street Journal.

Mas, mesmo antes de o governo de Enrico Letta cair, há duas semanas, a proposta de transferência já havia levantado críticas de que a ajuda era injusta, dadas as dificuldades financeiras de outras cidades. Alguns políticos disseram que Roma deveria, em vez disso, vender ativos valiosos, como empresas de serviços públicos.

Roma há muito tem dificuldades para equilibrar suas contas. Devido a uma escassez de indústrias, a cidade depende pesadamente das taxas de coleta de lixo e da venda de passagens de ônibus e metrô, por isso se esforça muito mais que outras cidades europeias para coletá-las. Cerca de um em cada quatro passageiros do sistema de transporte público de Roma não compra bilhetes, o que representa cerca de 100 milhões de euros em receita perdida por ano. Em Londres, apenas 2% dos passageiros na rede de transporte público não pagam.

Ao mesmo tempo, o absenteísmo de funcionários das agências de transporte público e de coleta de lixo de Roma chega a 19%, muito acima da média nacional.

Há apenas seis anos, cerca de 12 bilhões de euros em dívidas da cidade foram transferidos a um fundo especial subsidiado e garantido pelo governo nacional numa iniciativa que visava dar a Roma a oportunidade de se reerguer. Mas a economia da Itália encolheu quase 10% desde então, erodindo a base tributária à medida que programas nacionais de austeridade empurraram custos adicionais para os governos locais.

Mesmo antes do decreto "Salve Roma", Marino já estava tendo que tomar decisões difíceis. Ele elevou as taxas de cremação e de cemitérios e planeja centralizar as compras da cidade, medida que, segundo ele, vai gerar uma economia de 300 milhões de euros por ano.

Agora, sem a transferência do governo central, ele pode ser forçado a impor uma taxa adicional sobre imóveis e salários – tributação que já é uma das mais altas do país – e reduzir os salários dos 20.000 funcionários da cidade ou cortar serviços como creches ou programas de capacitação profissional – medidas também impopulares.

Mas a consequência política poderia ser grave. O prefeito de Taranto, uma cidade no sudeste do país que declarou moratória de 637 milhões de euros em 2006, obteve uma das taxas de intenção de voto mais baixas do país depois de eliminar serviços.

Renzi, que era prefeito de Florença antes de assumir o cargo de primeiro-ministro, deve promulgar um novo decreto para Roma em breve, embora os termos pareçam incertos. Ele tem dito que pretende dar às administrações locais mais margem de manobra com o orçamento.

Medidas draconianas também poderiam exacerbar as lutas históricas de Roma para lidar com o seu crescimento e equilibrar as necessidades do seu centro histórico, que recebe cerca de 10 milhões de turistas por ano, com uma periferia mal atendida. A população de Roma cresceu dez vezes desde meados do século XIX. Poucos turistas vêm a periferia da cidade, mas ela abriga mais de 80% dos 2,6 milhões de residentes.

Cerca de 400.000 pessoas vivem além do anel viário da capital e a maioria delas não pode contar com transporte público, o que faz com que elas usem o carro para ir ao trabalho. Roma tem 978 carros para cada 1.000 habitantes, mais de duas vezes a taxa de Paris e quase três vezes a de Londres. As chuvas fortes que atingiram Roma recentemente causaram grandes danos à sua rede rodoviária, expondo a necessidade de maior manutenção.

Se os serviços básicos não melhorarem, "as pessoas simplesmente irão embora ... e Roma vai acabar como Veneza", que hoje tem uma população pequena e envelhecida, diz Francesco Rosso, um geólogo que há 20 anos leva três horas para chegar ao trabalho no centro da cidade.

O turismo é uma importante fonte de receita, mas não é uma panaceia. Considerando o tamanho de suas populações, a participação do turismo em Roma é apenas a metade do nível de Florença, de acordo com Pierluigi Testa, chefe de um grupo de defesa cívica. E o turismo de feiras de conferência – um nicho lucrativo – cresceu apenas 12% na capital italiana desde 2000, comparado a 52% no mundo, diz Marino.

Além disso, o turismo de massa pode trazer problemas. A enorme popularidade do papa Francisco, por exemplo, levou uma onda de turistas a Roma. Espera-se que cinco milhões de peregrinos cheguem à cidade apenas para a canonização do Papa João Paulo II e do Papa João XXIII, em abril.

"Os peregrinos podem ser tanto um fardo quanto uma benção", diz Marino, que vai de bicicleta para o trabalho. Segundo ele, muitos turistas chegam em grandes ônibus e já trazem suas próprias refeições, deixando para trás um monte de lixo em vez de notas fiscais.

Fonte: The Wall Street Journal

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