Economista, Especialista em Economia e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Paraná e Graduando em Estatística, também, pela Universidade Federal do Paraná.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Entre a ortodoxia e a mudança do modelo econômico

Insatisfação com o desempenho econômico é o ponto de contato na série de artigos escritos para o 'Estado'.

O ano de 2013 termina com uma situação global um pouco menos desconfortável para o Brasil, comparada à turbulência de junho a agosto, mas há um nítido sentimento de insatisfação, à esquerda e à direita, com o desempenho econômico do País.
Na seleção de artigos publicados neste caderno, escritos especialmente para o Estado, é reconfortante verificar que Barry Eichengreen, um dos mais respeitados especialistas em economia internacional do planeta, considera que o início do "tapering", a redução gradual da política expansionista de compra de títulos pelo Federal Reserve (Fed, o BC americano), não deve trazer um novo surto de instabilidade para as economias emergentes, como o Brasil.

Por outro lado, as críticas à política econômica da presidente Dilma Rousseff vêm de pontos de vista tão distintos quanto os de Amir Khair, ex-secretário de Finanças de Luiza Erundina na Prefeitura de São Paulo, e André Lara Resende e Gustavo Franco, ligados ao Plano Real.

Para Khair, o "fracasso da política econômica", com o crescimento médio no triênio 2011/2013 de apenas 2%, a alta da inflação e o aumento dos déficits nominal e em conta corrente, só pode ser superado com novas rodadas de redução dos juros e de desvalorização do câmbio. Essa visão choca-se de frente com a crítica ortodoxa ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, e sua equipe, segundo a qual a tentativa de forçar a queda dos juros e a alta do dólar foi um dos elementos da "nova matriz econômica" que torpedeou o crescimento do PIB.

Segundo Franco, o Brasil foi bafejado pelos ventos favoráveis da internacionalização da economia, do crescimento chinês, do bônus demográfico (força de trabalho crescendo mais que a população) e saneamento do sistema bancário. Diante de tantos trunfos, o governo optou por não cuidar do ambiente de negócios, degradar a política fiscal e fechar a economia.

Já Lara Resende desenvolve em seu artigo um diagnóstico amplo sobre o "capitalismo de Estado patrimonialista", no qual afirma que "o Estado brasileiro não está à altura do estágio de desenvolvimento do País". Assim, para além dos problemas conjunturais causados pela piora do desempenho fiscal, existe a questão de que o setor público no Brasil "atua contra a sociedade, e a favor de seus próprios interesses".

Lara Resende considera que a primeira tarefa do próximo governo deveria ser a de "reconstruir o Estado", que é "caro e incompetente". Ele faz a comparação com o Estado chinês, que "é competente, custa pouco e investe muito", mas ressalva que o Brasil não tem como adotar o "autoritarismo burocrático competente da China". Assim, a solução sugerida é a descentralização, com "autonomia aos Estados e aos municípios em todas as suas esferas, desde a fiscal, até a segurança, a saúde e a educação".

O economista José Roberto Mendonça de Barros, por sua vez, reflete sobre os prolongados problemas da indústria brasileira, que nem a desvalorização de aproximadamente 15% do real conseguiu resolver. Criticando a falta de integração industrial do Mercosul e o alheamento do Brasil das cadeias internacionais de produção, Mendonça de Barros elogia, por outro lado, os programas de estímulo à inovação.

Para o economista, os grandes testes da atual política industrial serão os setores petrolífero e automotivo. No primeiro, é preciso compatibilizar a saúde financeira da Petrobrás com seu pesado programa de investimentos, e relançar a petroquímica e o etanol. No setor automotivo, o economista dá como certa uma "crise de superprodução".

Centralização. Luiz Gonzaga Belluzzo, interlocutor da presidente Dilma Rousseff, ao contrário de Mendonça de Barros, vê um papel crucial do real valorizado nas agruras da indústria. Ele enxerga um "risco de regressão da estrutura industrial, a despeito da modernização defensiva dos setores que ainda sobrevivem à ofensiva dos manufaturados chineses". Segundo Belluzzo, a "dilaceração das cadeias produtivas" só será reparada com "a centralização do capital, agora disperso em empresas sem a escala requerida para participar do atual estágio da concorrência global".

Fica claro, portanto, que os problemas que a economia brasileira enfrenta, com o mercado de trabalho aquecido como único ponto positivo remanescente, não estão levando a um diagnóstico consensual. Ao contrário, o que este caderno de artigos deixa evidente é a divisão cada vez mais acirrada entre a corrente que prega a volta à ortodoxia e aqueles que gostariam de redobrar a aposta nas mudanças do modelo econômico. Num ano eleitoral, essa disputa promete debates acalorados. Se, porém, o cenário internacional piorar muito para o Brasil, o que não é a aposta principal neste momento, o País pode ser forçado a um ajuste doloroso que independe das escolhas de política econômica.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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