O primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, disse que prevê o ressurgimento do Japão assumindo um papel de liderança mais assertiva na Ásia para contrabalançar o poder da China. O objetivo seria colocar Tóquio à frente dos países da região, que estão cada vez mais aflitos com a escalada militar de Pequim e a possibilidade de uma retirada americana.
Em entrevista exclusiva ao The Wall Street Journal, Abe também defendeu seu programa de reformas econômicas contra crescentes críticas de que o pacote carece de substância — apesar de ter oferecido poucos detalhes sobre os novos programas, ou um calendário, o que os investidores estrangeiros têm buscado ansiosamente.
"Eu percebi que há uma expectativa de que o Japão exerça uma liderança não apenas no plano econômico, mas também no de segurança na região da Ásia e da Oceania", disse Abe, referindo-se a suas reuniões com líderes da região em uma série de encontros este mês.
Na sua tentativa de continuar a conciliar seu desejo de implementar políticas de estímulo econômico com a necessidade de pagar a enorme dívida japonesa, o primeiro-ministro disse que estava aberto para rever a segunda etapa de um plano para aumentar o imposto sobre vendas em 2015 se a economia enfraquecer depois do primeiro aumento ser implementado no segundo trimestre.
Menos de um ano após assumir o cargo, Abe já se tornou um dos primeiros-ministros do Japão mais influentes das últimas décadas. Ele chacoalhou a política econômica do país, na tentativa de tirar o Japão de uma recessão que dura 20 anos, e elaborou uma diplomacia mais ativa para um país cuja liderança global tem sido abalada por uma alta rotatividade de primeiros-ministros fracos.
Na entrevista, Abe traçou uma ligação direta entre a busca por um Japão próspero e um país exercendo maior influência na região e no mundo.
"O Japão encolheu demais nos últimos 15 anos", disse o líder, explicando como as pessoas se tornaram "isoladas", com alunos esquivando-se de oportunidades de estudar fora e uma população cada vez mais oposta à ideia de Tóquio prestar ajuda a outros países.
"Ao recuperar uma economia forte, o Japão também vai recuperar a confiança, e gostaríamos de contribuir mais para tornar o mundo um lugar melhor."
A posição de Abe expressa durante a entrevista reflete sua visão nacionalista mais ampla e de longa data de um Japão mais assertivo, uma visão que, ele defende, pode quebrar as restrições impostas aos militares japoneses pela constituição pacifista do pós-guerra, elaborada pelos EUA — e que também tem sido prejudicada pelo declínio econômico.
Abe deixou claro que uma forma importante de o Japão "contribuir" seria se opor à China na Ásia.
"Há preocupações de que a China estaria tentando mudar o status quo a força, ao invés de seguir as leis. Mas se a China optar por seguir esse caminho, ela não será capaz de emergir de forma pacífica", disse Abe.
"Portanto, ela não deveria escolher esse caminho, e muitos países esperam que o Japão expresse fortemente essa visão. E eles esperam que, como consequencia, a China atue de maneira responsável na comunidade internacional."
O Ministério das Relações Exteriores da China não respondeu imediatamente a pedidos para comentar as afirmações de Abe. No passado, o governo chinês disse que o governo de Abe corria o risco de promover o renascimento do militarismo de direita no Japão.
Os comentários de Abe chegam num período de intensificação das tensões entre os dois gigantes asiáticos, com a redução drástica dos contatos diplomáticos de alto nível entre os países, em meio a uma disputa territorial no Mar da China Oriental. Apesar de o conflito preceder a data em que Abe assumiu o cargo de primeiro-ministro, em dezembro de 2012, Pequim o tem acusado de piorar as relações entre os países com uma retórica assertiva defendendo reivindicações do Japão e ampliando a defesa da guarda costeira no arquipélago conhecido como Senkaku, no Japão, e Diaoyu, na China.
Seus comentários também seguem meses de ativa diplomacia que o levou a marcar reuniões de cúpula com chefes de Estado em praticamente todos os países da região — com as notáveis exceções da China e da Coréia do Sul.
Em dezembro, ele pretende receber no Japão os líderes dos dez membros da Associação das Nações do Sudeste Asiático. O evento pretende celebrar os 40 anos dos laços do Japão com o bloco, que inclui países da Tailândia à Indonésia, passando pelas Filipinas e Myanmar, mas também para ampliar ainda mais o papel de líder do Japão numa região em que a China também tem procurado aumentar sua influência.
A busca de Abe por um papel maior estava plenamente explícita em encontros no Sudeste Asiático este mês, onde por meio de comentários públicos ele abertamente tomou partido das Filipinas na disputa territorial entre Manila e Pequim no Mar da China Meridional. O papel de Abe nessas reuniões foi amplificado pela ausência do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, que cancelou sua participação nos encontros na Indonésia e Brunei por causa da paralisação em Washington em meio à discussão do aumento do teto da dívida.
Alguns líderes manifestaram preocupação que a ausência de Obama simbolizasse um recuo da participação e da influência americana na região, à medida em que as divisões políticas internas fragilizam o líder americano. Abe se recusou a responder diretamente a uma pergunta sobre se estaria preocupado com a queda da influência do aliado do Japão. "No mundo de hoje, há muitas coisas que só os EUA podem cuidar. E, neste contexto, os EUA assumem a liderança e esperamos que os EUA continuem fazendo isso."
Abe tem acumulado um poder raro para um líder japonês, guiando seu partido este ano para o controle unificado do parlamento e aproveitando a popularidade de seu programa econômico, apelidado de Abenomics. Uma dose rápida de estímulo — com a política de incentivo monetário do Banco do Japão e novos gastos em projetos públicos — rendeu ao país o título de economia e mercado acionário que mais cresceram entre as nações desenvolvidas neste ano.
Mas, agora, o programa econômico de Abe está num momento decisivo. A próxima fase envolve debater reformas econômicas politicamente difíceis e medidas de desregulamentação, como tornar mais fácil às empresas realizar demissões ou reduzir proteções ao setor agrícola. Ele está enfrentando críticas cada vez mais fortes da imprensa local, economistas e investidores globais de que seus planos "pró- crescimento" são muito vagos.
Abe disse que o governo havia apresentado projetos de lei ao Parlamento, ressaltando que o que importa são os resultados.
"Estou ciente das várias críticas à minha estratégia de crescimento. Ela pode deixar a desejar em termos de recursos chamativos, mas acho que o importante é o resultado."
Ele disse esperar que o desempenho da economia recue por causa do aumento de impostos entre abril e junho e que a chave está em como ela vai se recuperar depois desse período. "Eu gostaria de acompanhar cuidadosamente o quanto ela pode recuperar em julho, agosto e setembro. Então, eu tomarei uma decisão apropriada."
Fonte: The Wall Street Journal
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