Além de consumir muita água, o processamento do café por via úmida cria outro problema ambiental, já que a água residuária é altamente poluente, a ponto de seu descarte ter de ser feito em lagoas de decantação, localizadas em áreas afastadas de cursos d'água.
Conforme o agrônomo e membro do corpo técnico da empresa italiana illycaffè, Sérgio D'Alessandro, após passar por alguns ciclos de lavagem, essa água se torna dez vezes mais poluente do que o esgoto doméstico. "O nível de demanda bioquímica de oxigênio (DBO) dessa água gira em torno de 5 mil mg/litro, e o limite máximo de DBO para que o resíduo possa ser jogado nos mananciais é de apenas 60 mg/litro." Não se trata, obviamente, dos mesmos poluentes encontrados no esgoto doméstico.
Mas, segundo D'Alessandro, além de acumular matéria orgânica, essa água fica enriquecida com macronutrientes como nitrogênio, potássio e fósforo. "Portanto, deixá-la parada em um lago, além de representar um risco de contaminação do solo no longo prazo é um desperdício", diz ele, que tem dado palestras visando a incentivar os produtores a usar esse resíduo como adubo, incorporando-o ao sistema de irrigação das propriedades.
Em Paula Cândido (MG), o cafeicultor Waldir Mol tem utilizado com êxito a água residuária para irrigar 34 hectares de café. Após ser reusada várias vezes, acumulando quantidade considerável de matéria orgânica, a água é bombeada para o alto de uma colina e, de lá, desce por valas abertas entre as fileiras do cafezal. "É uma destinação mais correta do ponto de vista ambiental e que traz economia em adubação química", destaca Mol.
Em Venda Nova do Imigrante (ES), o cafeicultor Pedro Carnielli também adota a mesma prática. Entretanto, no lugar de deixar a água infiltrar por valas, como Mol, ele faz a aspersão da água nas plantas e monitora constantemente os níveis de fixação dos nutrientes no solo. "Além de me livrar de um problema eu ainda consegui enriquecer minha área".
No fim, irrigação e fertilização da lavoura
O manejo das águas residuárias do café tem outras vantagens, além da economia de água no processo de lavagem e descascamento dos grãos cerejas. Ao fim do processo, a água pode ser utilizada uma última vez, desta vez na irrigação dos cafezais. A água é rica em nutrientes, que retornam à lavoura, via fertiirrigação. "Do ponto de vista da sustentabilidade é interessante, já que passa a ser cada vez menos necessário buscar nutrientes fora", diz o pesquisador da Embrapa Café, Sammy Soares.
Além disso, no futuro, a tendência é a de que os produtores passem a ter de pagar pela água que retiram na natureza, segundo explica o chefe da fazenda experimental do Incaper em Venda nova do Imigrante (ES), Aldemar Moreli.
De acordo com ele, já existem no Estado normas que preveem essa cobrança, mas que ainda não estão em prática. Em São Paulo, por exemplo, essa cobrança já começou em algumas regiões. Moreli destaca, ainda, que os órgãos responsáveis pelo licenciamento das unidades de processamento de café já estão exigindo também o manejo da água residuária.
Reúso da água chega à cafeicultura
Sistema baseado em tanques de decantação permite que água volte pelo menos três vezes à lavagem dos grãos.
Você tem ideia de quanta água é usada na lavoura para garantir, lá na ponta, uma xícara de café de qualidade? Pois vai muita. De acordo com estimativas de pesquisadores da Universidade Federal de Lavras (MG), o processamento do café por via úmida, método utilizado para obtenção do café cereja descascado, considerado especial, consome, para cada litro de fruto processado, cerca de 3 a 5 litros de água limpa.
Trocando em miúdos, se para obter uma saca de 60 quilos de café é necessário um volume aproximado de 480 litros de frutos, a produção de uma única saca do grão beneficiado, pronto para ser torrado, pode consumir até 2.400 litros de água.
Ampliando a conta para o volume total de café cereja descascado produzido no Brasil (equivalente a cerca de 15% da safra de grãos, ou 7,05 milhões de sacas), o número ficaria próximo dos 17 bilhões de litros de água.
Mas uma técnica de manejo desenvolvida pelo pesquisador Sammy Soares, da Embrapa Café, em parceria com pesquisadores do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), e com o Consórcio de Pesquisa do Café, vem sendo testada com sucesso por produtores da região de Viçosa (MG) e Venda Nova do Imigrante (ES) e promete reduzir drasticamente esse números.
Trata-se de um sistema com estrutura baseada em caixas d"água, peneiras e tubos de PVC, que permite o reúso, por várias vezes - e não apenas uma utilização, como acontece normalmente -, da água empregada na unidade de processamento do café para fazer a lavagem e descascamento dos grãos.
Por decantação. O funcionamento é relativamente simples, segundo explica Soares. Após lavar e descascar o café em equipamentos próprios, toda a água é bombeada para três caixas d"água, que funcionam, uma após a outra, como tanques de decantação. "Nessas caixas ficam depositados no fundo os resíduos sólidos maiores. Já livre desses resíduos, a água passa por uma peneira e está pronta para ser reutilizada na própria lavagem dos graõs."
Na fazenda do cafeicultor Waldir Mol, no município de Paula Cândido (MG), região de Viçosa, eram gastos por dia, no método convencional de lavagem e retirada da casca, entre 20 mil e 25 mil litros de água para processar 12 mil litros de fruto. Atualmente, após investir R$ 8 mil para instalar o sistema de reúso, esse consumo caiu para menos da metade. Para processar a mesma quantidade de café, Mol gasta agora entre 7 mil e 8 mil litros.
A média de gasto, que estava entre 3 litros de água para cada litro de fruto, baixou para 1,5 litro. De acordo com ele, após entrar na unidade de processamento, a água é reutilizada por mais três vezes.
E há quem acredite que essa economia pode ser maior. É o caso do chefe da fazenda experimental do Incaper em Venda Nova do Imigrante (ES) - onde o sistema foi testado pela primeira vez -, Aldemar Moreli. Ele está concluindo sua tese de mestrado sobre o assunto e afirma que é possível, por meio da reutilização, reduzir o consumo para um pouco mais de meio litro de água. Ou seja, quase um décimo da média atual.
Investimento. Em Venda Nova do Imigrante, o produtor Pedro Carnielli afirma ter atingido esse nível, mas com investimento de R$ 20 mil, maior do que o feito por Mol. Com a utilização de filtros industriais, Carnieri conta que conseguiu economizar em três quartos o consumo de água necessário para processar 20 mil litros de café por dia. Hoje, no lugar de gastar 40 mil litros diariamente, sua unidade de processamento consome 10 mil litros de água para o mesmo volume de café.
Apesar dos bons resultados, os pesquisadores envolvidos na pesquisa, iniciada há cinco anos, dizem que ainda são poucos os produtores que fazem o reúso da água no processamento do café. Para Moreli, mais do que a falta de costume, já que existe mesmo um intervalo de tempo entre a criação de uma nova tecnologia e sua efetiva aplicação, é preciso continuar investindo no aprimoramento do sistema para torná-lo cada vez mais eficiente e também de baixo custo.
"Este ponto é crucial, já que a maioria das unidades de processamento está nas mãos de pequenos e médios produtores." Entretanto, ele não ignora a importância de se baratear ainda mais o sistema para que grandes produtores também se interessem em adotá-lo.
Conforme o agrônomo e membro do corpo técnico da empresa italiana illycaffè, Sérgio D'Alessandro, após passar por alguns ciclos de lavagem, essa água se torna dez vezes mais poluente do que o esgoto doméstico. "O nível de demanda bioquímica de oxigênio (DBO) dessa água gira em torno de 5 mil mg/litro, e o limite máximo de DBO para que o resíduo possa ser jogado nos mananciais é de apenas 60 mg/litro." Não se trata, obviamente, dos mesmos poluentes encontrados no esgoto doméstico.
Mas, segundo D'Alessandro, além de acumular matéria orgânica, essa água fica enriquecida com macronutrientes como nitrogênio, potássio e fósforo. "Portanto, deixá-la parada em um lago, além de representar um risco de contaminação do solo no longo prazo é um desperdício", diz ele, que tem dado palestras visando a incentivar os produtores a usar esse resíduo como adubo, incorporando-o ao sistema de irrigação das propriedades.
Em Paula Cândido (MG), o cafeicultor Waldir Mol tem utilizado com êxito a água residuária para irrigar 34 hectares de café. Após ser reusada várias vezes, acumulando quantidade considerável de matéria orgânica, a água é bombeada para o alto de uma colina e, de lá, desce por valas abertas entre as fileiras do cafezal. "É uma destinação mais correta do ponto de vista ambiental e que traz economia em adubação química", destaca Mol.
Em Venda Nova do Imigrante (ES), o cafeicultor Pedro Carnielli também adota a mesma prática. Entretanto, no lugar de deixar a água infiltrar por valas, como Mol, ele faz a aspersão da água nas plantas e monitora constantemente os níveis de fixação dos nutrientes no solo. "Além de me livrar de um problema eu ainda consegui enriquecer minha área".
No fim, irrigação e fertilização da lavoura
O manejo das águas residuárias do café tem outras vantagens, além da economia de água no processo de lavagem e descascamento dos grãos cerejas. Ao fim do processo, a água pode ser utilizada uma última vez, desta vez na irrigação dos cafezais. A água é rica em nutrientes, que retornam à lavoura, via fertiirrigação. "Do ponto de vista da sustentabilidade é interessante, já que passa a ser cada vez menos necessário buscar nutrientes fora", diz o pesquisador da Embrapa Café, Sammy Soares.
Além disso, no futuro, a tendência é a de que os produtores passem a ter de pagar pela água que retiram na natureza, segundo explica o chefe da fazenda experimental do Incaper em Venda nova do Imigrante (ES), Aldemar Moreli.
De acordo com ele, já existem no Estado normas que preveem essa cobrança, mas que ainda não estão em prática. Em São Paulo, por exemplo, essa cobrança já começou em algumas regiões. Moreli destaca, ainda, que os órgãos responsáveis pelo licenciamento das unidades de processamento de café já estão exigindo também o manejo da água residuária.
Reúso da água chega à cafeicultura
Sistema baseado em tanques de decantação permite que água volte pelo menos três vezes à lavagem dos grãos.
Você tem ideia de quanta água é usada na lavoura para garantir, lá na ponta, uma xícara de café de qualidade? Pois vai muita. De acordo com estimativas de pesquisadores da Universidade Federal de Lavras (MG), o processamento do café por via úmida, método utilizado para obtenção do café cereja descascado, considerado especial, consome, para cada litro de fruto processado, cerca de 3 a 5 litros de água limpa.
Trocando em miúdos, se para obter uma saca de 60 quilos de café é necessário um volume aproximado de 480 litros de frutos, a produção de uma única saca do grão beneficiado, pronto para ser torrado, pode consumir até 2.400 litros de água.
Ampliando a conta para o volume total de café cereja descascado produzido no Brasil (equivalente a cerca de 15% da safra de grãos, ou 7,05 milhões de sacas), o número ficaria próximo dos 17 bilhões de litros de água.
Mas uma técnica de manejo desenvolvida pelo pesquisador Sammy Soares, da Embrapa Café, em parceria com pesquisadores do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), e com o Consórcio de Pesquisa do Café, vem sendo testada com sucesso por produtores da região de Viçosa (MG) e Venda Nova do Imigrante (ES) e promete reduzir drasticamente esse números.
Trata-se de um sistema com estrutura baseada em caixas d"água, peneiras e tubos de PVC, que permite o reúso, por várias vezes - e não apenas uma utilização, como acontece normalmente -, da água empregada na unidade de processamento do café para fazer a lavagem e descascamento dos grãos.
Por decantação. O funcionamento é relativamente simples, segundo explica Soares. Após lavar e descascar o café em equipamentos próprios, toda a água é bombeada para três caixas d"água, que funcionam, uma após a outra, como tanques de decantação. "Nessas caixas ficam depositados no fundo os resíduos sólidos maiores. Já livre desses resíduos, a água passa por uma peneira e está pronta para ser reutilizada na própria lavagem dos graõs."
Na fazenda do cafeicultor Waldir Mol, no município de Paula Cândido (MG), região de Viçosa, eram gastos por dia, no método convencional de lavagem e retirada da casca, entre 20 mil e 25 mil litros de água para processar 12 mil litros de fruto. Atualmente, após investir R$ 8 mil para instalar o sistema de reúso, esse consumo caiu para menos da metade. Para processar a mesma quantidade de café, Mol gasta agora entre 7 mil e 8 mil litros.
A média de gasto, que estava entre 3 litros de água para cada litro de fruto, baixou para 1,5 litro. De acordo com ele, após entrar na unidade de processamento, a água é reutilizada por mais três vezes.
E há quem acredite que essa economia pode ser maior. É o caso do chefe da fazenda experimental do Incaper em Venda Nova do Imigrante (ES) - onde o sistema foi testado pela primeira vez -, Aldemar Moreli. Ele está concluindo sua tese de mestrado sobre o assunto e afirma que é possível, por meio da reutilização, reduzir o consumo para um pouco mais de meio litro de água. Ou seja, quase um décimo da média atual.
Investimento. Em Venda Nova do Imigrante, o produtor Pedro Carnielli afirma ter atingido esse nível, mas com investimento de R$ 20 mil, maior do que o feito por Mol. Com a utilização de filtros industriais, Carnieri conta que conseguiu economizar em três quartos o consumo de água necessário para processar 20 mil litros de café por dia. Hoje, no lugar de gastar 40 mil litros diariamente, sua unidade de processamento consome 10 mil litros de água para o mesmo volume de café.
Apesar dos bons resultados, os pesquisadores envolvidos na pesquisa, iniciada há cinco anos, dizem que ainda são poucos os produtores que fazem o reúso da água no processamento do café. Para Moreli, mais do que a falta de costume, já que existe mesmo um intervalo de tempo entre a criação de uma nova tecnologia e sua efetiva aplicação, é preciso continuar investindo no aprimoramento do sistema para torná-lo cada vez mais eficiente e também de baixo custo.
"Este ponto é crucial, já que a maioria das unidades de processamento está nas mãos de pequenos e médios produtores." Entretanto, ele não ignora a importância de se baratear ainda mais o sistema para que grandes produtores também se interessem em adotá-lo.
Fonte: JMA-Jornal Meio Ambiente | O Estado de S. Paulo
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