Promover relacionamento com o público, divulgar uma marca e desenvolver setores da economia brasileira são os principais objetivos da indústria de eventos no país. Grandes projetos, no entanto, geram também enormes impactos ao meio ambiente, à sociedade e à economia. As grandes empresas já se preocupam com os danos causados e tentam minimizá-los, no entanto, com o crescimento do conceito no mercado, as companhias procuram seguir medidas simples para se posicionarem como sustentáveis.
Com o intuito de auxiliar os organizadores neste processo, a ABNT Brasil instituiu a norma ISO 20121. A medida estará vigente a partir de junho deste ano e não será obrigatória, porém trará diretrizes para os gestores de produção, oferecendo soluções para as empresas desenvolverem a sustentabilidade em eventos, propondo mudanças em todas as etapas de planejamento.
“As propostas são de que os impactos causados tanto na questão ambiental quanto social e econômica sejam medidos pelas empresas e também pelos stakeholders, que são os fornecedores, organizadores, patrocinadores, público visitante e os participantes. Desejamos que todos os envolvidos possam medir quais os impactos causados nestas três áreas e tentem minimizar os danos das ações”, declara Daniel de Freitas, Diretor de Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Eventos (IBEV), em entrevista ao Mundo do Marketing.
Conscientização e engajamento de todos os envolvidos
Uma das preocupações abordada nas diretrizes do ISO 20121 é o engajamento do público e dos participantes nos eventos. É necessário que as empresas transmitam a conscientização de que os ouvintes e os palestrantes fazem parte do projeto de sustentabilidade e não são apenas agentes passivos no processo. Os visitantes estão incluídos nos impactos desde a forma como escolhem comparecer à programação, se pensam no desperdício de combustível e optam pelo transporte público ou a bicicleta.
Os fornecedores também estão envolvidos na ação. Recrutar profissionais e utilizar materiais próximos ao local do evento são formas de cortar custos e diminuir os poluentes no ar. A realização da apresentação e as embalagens utilizadas fazem parte de uma gama de informações que precisam ser avaliadas ao longo do processo de planejamento. “As lixeiras de coleta seletiva, por exemplo, servem para a empresa realizar a divisão de materiais orgânicos e recicláveis, mas se o participante do evento não colabora colocando o lixo no lugar certo, a iniciativa não cumpre o seu objetivo. É preciso, portanto, conscientizar o público de que ele é parte do procedimento”, afirma Freitas.
O engajamento das comunidades também está relacionado ao legado que os eventos deixam para a região. “Uma empresa realizou um evento fora dos seus domínios e queria montar um cenário. A companhia escolheu contratar uma ONG de artesãos locais e o cenógrafo da empresa treinou os trabalhadores da comunidade, que montaram todo o projeto. Os custos foram bem menores do que se chamassem profissionais de outra cidade e ainda gerou um impacto positivo, pois deixaram um conhecimento naquela comunidade”, explica Flávia Goldenberg Vice-Presidente de Relações Institucionais da Associação de Marketing Promocional (AMPRO), em entrevista ao portal.
Eventos precisam gerar legado e minimizar impactos sociais
As empresas, normalmente, focam a sustentabilidade em ações de diminuição de impacto ambiental, como a reciclagem e o descarte correto dos resíduos após eventos. Os impactos sociais, no entanto, não são prioridades no planejamento e causam grandes transtornos para os cidadãos. Como lembra o Diretor de Sustentabilidade do Ibev, em 2010, a Igreja Universal convocou a população para participar de um culto na Enseada de Botafogo, com a previsão de 100 mil pessoas, entretanto, compareceram um milhão. O evento causou uma desordem no trânsito de toda a Zona Sul do Rio de Janeiro durante horas e não havia também transportes e banheiros para atender a todos os presentes.
Os impactos devem ser previstos antes da realização dos eventos para não gerarem tumultos. As Olimpíadas 2016, no Rio de Janeiro, receberam grande apoio da população para serem sediadas no país, no entanto, quando começaram a construir a estrutura para receber o evento e desapropriaram casas por preços mais baixos que os valores dos imóveis, houve reclamação das mesmas pessoas que vibraram com a escolha da cidade como sede.
É necessário que os eventos tragam benefícios para os moradores da região antes, durante e depois da realização. Os organizadores devem se perguntar: a Vila Olímpica servirá a população? As estruturas montadas serão voltadas para o acesso de qualquer pessoa? As tendas utilizadas no Fórum Global Mundial ECO 92, no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, por exemplo, foram transformadas em Lonas Culturais depois do evento.
Por iniciativa da Secretaria de Cultura, a estrutura serviu ao propósito de levar atividades culturais a preços populares para regiões da cidade com baixo IDH e sem equipamentos culturais, tornado-as pontos de entretenimento para a população. “Sustentabilidade pressupõe acessibilidade, inclusão e um legado. O Festival de Inverno de Campos do Jordão é lembrado por várias marcas durante a alta temporada, mas nenhuma se preocupa em deixar uma herança social ou gerar um efeito positivo para os moradores da cidade no resto do ano”, expõe Flávia.
Investimentos a longo prazo e mudança de comportamento
Além dos impactos ambientais e sociais, as empresas precisam ficar atentas aos econômicos, que não são apenas o retorno financeiro do evento, mas todos os investimentos feitos para trazer progresso ao espaço utilizado. Os organizadores necessitam compreender os gastos de uma produção mais sustentável para perceber que a opção aparentemente mais cara é também a mais rentável.
“Nos eventos que ajudamos a organizar, sugerimos que as empresas usem produtos biodegradáveis na limpeza. Elas alegam que o material é muito mais custoso, mas, na verdade, o produto sai até mais barato. Acontece que, na comparação de um litro de ambos, o biodegradável é mais caro, por outro lado a diluição dele é bem maior que um desinfetante comum, com concentração de um para 500 litros de água, o que acaba sendo compensador”, diz o Diretor de Sustentabilidade da IBEV.
Os orçamentos dos eventos saem em média 10% a 15% mais caros que os comuns, segundo a agência ConceitoEco. Alimentos orgânicos, tecidos de material PET e banners de algodão ainda custam mais que as alternativas tradicionais, mas é necessário enxergar a sustentabilidade como um processo de maturidade, dentro das condições operacionais e financeira de cada corporação.
Começar com pequenas ações
Atualmente, as empresas recebem do IBEV uma certificação de sustentabilidade de acordo com as realizações prometidas e cumpridas pela companhia durante o evento. São divididas em cinco níveis, que buscam estimular as empresas a refletirem sobre como diminuir os seus impactos com uma certificação mínima até uma de excelência na estratégia.
“A certificação funciona de forma que as empresas se propõem a fazer determinadas coisas, como utilizar 90% da iluminação do evento com lâmpadas LED e com isso reduzir ‘x’ de consumo de energia, usar o ar condicionado com um termostato que quando a sala estiver vazia desliga sozinho, sensores de presença para as luzes e assim por diante”, exemplifica Freitas.
A realização de pequenas mudanças na produção pode trazer diferenças para a imagem e postura da empresa. O uso de equipamentos de segurança para a equipe de montagem, o oferecimento de alimentos orgânicos e a acessibilidade dos portadores de deficiências físicas são exemplos de medidas práticas e sustentáveis.
“Antes de ser executado, o evento tem de ser raciocinado de forma sustentável no seu planejamento estratégico, desde a ambientação, que inclui locais que possam utilizar o máximo de luz natural para economizar energia elétrica, até a consideração que existem pessoas que não comem carne. O espaço também deve ter uma ampla disponibilidade de transportes públicos”, alega Ana Paula Caribé, Diretora da agência Conceito Eco, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Falsas compensações para a natureza
A execução de medidas sustentáveis em eventos, por vezes, tem perdido o seu real foco, que é a diminuição dos impactos causados, por uma regra de compensações de emissões de carbono na atmosfera sugerida pela Unesco. A iniciativa é válida em alguns casos, entretanto, muitas companhias deixam de se preocupar com os danos que podem acarretar a uma comunidade para calcular o quanto emitiram de dióxido de carbono (CO2) e fazerem uma margem de compensação.
O ressarcimento pode ser feito plantando árvores. O processo é demorado e gerará retorno depois de 15 a 20 anos, além de não ser garantido que o plantio dê certo. Outro meio é a compra de créditos de carbono na Bolsa de Valores, gerados por medidas que transformaram CO2 em oxigênio puro. Estes caminhos não tornam o evento mais sustentável, mas maquiam uma possível falta de maturidade da empresa em lidar com os seus problemas.
“Uma indústria não pode despejar resíduos químicos no mar e nos rios e depois compensar com a plantação de árvores. Os impactos sociais que a empresa pode causar não têm como serem indenizados. Se não foram previstos equipamentos para a participação de pessoas deficientes, como uma rampa de acesso ao palco, e o palestrante é uma cadeirante, o constrangimento da pessoa e do público será irreparável. Aconselhamos as empresas a pensarem primeiro na redução e não na compensação, que apenas atinge o meio ambiente e a sustentabilidade é um tripé”, finaliza o Diretor de Sustentabilidade da Ibev.
Fonte: JMA-Jornal Meio Ambiente | Mundo do Marketing
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