Uma queda nos gastos militares e o fim de programas federais de estímulo estão desacelerando ainda mais a já fraca recuperação econômica dos Estados Unidos.
Nas últimas semanas, o debate político em Washington se voltou ao "precipício fiscal" que se aproxima, ou os bilhões de dólares em cortes de gastos e aumentos de impostos programados para entrar em vigor no início do novo ano fiscal. A Comissão do Orçamento do Congresso, o presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke, e outros alertaram que os cortes levarão os EUA a uma recessão no próximo ano, com alguns economistas argumentando que a incerteza gerada pelo debate poderia afetar negativamente a economia muito antes disso.
Mas dados econômicos recentes mostram que mesmo antes de o precipício fiscal se materializar, os gastos federais já vêm caindo e prejudicando a recuperação. Os gastos e investimentos do governo americano caíram a uma taxa anualizada de 0,4% no segundo trimestre e 3,3% no ano passado. O emprego no governo diminuiu em mais de 52.000 vagas no ano passado e pela primeira vez está abaixo do nível do início da recuperação.
Tais dados subestimam o efeito total dos cortes, já que a redução nos gastos do governo afeta empreiteiros civis e militares e rouba recursos de projetos de infraestrutura financiados pelo governo em estados e municípios. Considerados em conjunto, os cortes estão em parte anulando o efeito do crescimento do setor privado que, embora lento, tem sido consistente.
"É inacreditável o quanto a economia já está sendo prejudicada pela queda considerável nos gastos federais", diz Joe LaVorgna, economista-chefe do Deutsche Bank nos EUA.
No longo prazo, é claro, a redução nos gastos federais, possivelmente em sintonia com um aumento de impostos, deve ajudar a controlar os enormes déficits orçamentários e colocar a economia em bases mais sólidas. Vários especialistas, de Bernanke aos líderes da comissão de orçamento do presidente Barack Obama, pediram aos legisladores que tomem medidas agora para lidar com as questões fiscais de longo prazo do governo.
Mas os cortes orçamentários chegam num momento difícil para a economia dos EUA, que vem perdendo fôlego depois de ter acelerado este ano. A recessão em grande parte da Europa e uma desaceleração no crescimento da China vem reduzindo a demanda por exportações americanas, atingindo o setor manufatureiro, que foi o motor do início da recuperação. O fraco mercado de trabalho e um setor financeiro cambaleante afetaram o consumo, que era a esperança de alguns economistas para impulsionar o crescimento econômico este ano. A economia do país cresceu a uma taxa anualizada de 1,5% no segundo trimestre, ante os 2% de crescimento no primeiro trimestre, e a maioria dos economistas projeta um crescimento fraco para o resto do ano.
Os cortes federais são uma reversão da estratégia usada durante a recessão, quando ambos os presidentes George W. Bush e Obama tentaram incentivar o crescimento, aumentando despesas através de resgates financeiros e programas de estímulo econômico. Os programas foram alvo de crítica da oposição, mas a maioria dos economistas acredita que eles ajudaram a suavizar os efeitos da recessão.
Agora, os fundos de estímulo estão secando. A projeção é de que os governos estaduais e locais recebam US$ 20,8 bilhões em fundos federais de estímulo no ano fiscal de 2012, que termina em setembro, bem abaixo do total combinado de US$$ 180,7 bilhões recebidos nos exercícios de 2010 e 2011, segundo a agência do governo americano que audita os gastos. No ano fiscal de 2013, a previsão é de que o estímulo a estados e municípios cairá para US$ 14,3 bilhões.
Ao mesmo tempo, os gastos militares caíram por três trimestres consecutivos, à medida que as guerras no Iraque e no Afeganistão abrandaram e o Pentágono se prepara para mais cortes no orçamento.
O corte no gasto militar tem efeito no setor privado. A BRS Aerospace, empresa da Flórida que fabrica os pára-quedas usados para levar suprimentos a soldados em áreas remotas ou hostis, viu seus negócios minguar já que muitas das tropas que estavam no Iraque e no Afeganistão voltaram para casa, disse o diretor-presidente, Larry Williams. Segundo Williams, uma das linhas de montagem de um tipo de pára-quedas que o Pentágono deixou de encomendar teve de ser desativada. Como resultado, a empresa cortou cerca de 300 empregos na Flórida e 100 em Minnesota, disse ele. E o recuo da empresa também tem seu próprio efeito em cascata, já que a BRS se viu obrigada a encomendar menos tecido, equipamentos e outros materiais de seus fornecedores.
O impasse em Washington também tem bloqueado o financiamento de alguns projetos. A Astec Industries Inc., uma fabricante de equipamentos para produzir asfalto e pavimentar estradas com sede no Tennessee, teve uma queda de 26% no seu lucro trimestral, em parte devido à demora do Congresso em aprovar um projeto de lei para financiamento de estradas.
"Isso resultou em atrasos e, em alguns casos, na eliminação de projetos durante o auge da temporada de construção de estradas", disse J. Don Brock, presidente da Astec, em um comunicado na semana passada.
Os cortes são significativos especialmente para as comunidades que dependem dos gastos militares. Okaloosa, o condado da Flórida onde fica a base aérea de Eglin, depende do setor de defesa para sustentar 60% de sua economia, segundo um estudo recente da Universidade da Flórida. Jim Breitenfeld, um gerente da agência de desenvolvimento econômico do condado, disse: "Quando alguém em Washington espirra sobre uma questão de defesa, nós aqui dizemos "atchim".
Fonte: The Wall Street Journal