sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Efeito cascata no setor de energia

Fornecedores de equipamentos elétricos, no país, são forçados a cortar custos e reestruturar as atividades para sobreviver

Redução das tarifas de energia, concorrência com importados e as denúncias de cartel contra as gigantes Siemens e Alstom vêm provocando um efeito dominó entre os fornecedores de equipamentos elétricos no país. Com a postergação, por geradores e distribuidores, de investimentos e até de pagamentos de faturas, a ordem é cortar custos e reestruturar as atividades para sobreviver. No mundo, o setor já convive com o fechamento de fábricas, como alternativa para eliminar a sobrecapacidade de produção.

"Não estamos vivendo um momento confortável. As empresas têm tentado ao máximo enxugar custos, porque a capacidade de concorrer está reduzida",diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica, Humberto Barbato. A entidade deve publicar nos próximos dias a revisão de suas projeções para o ano, que previam um crescimento de 10% nas vendas de equipamentos de geração, transmissão e distribuição de energia, segmento conhecido pela sigla GTD.

No primeiro semestre, diz, o segmento sofreu com a postergação dos investimentos em distribuição de energia, reflexo da lei 12.783, que reduziu a conta de luz. "Sondagens com nossos associados indicam que os investimentos foram reduzidos momentaneamente", comenta. De fato, balanços do segundo trimestre apontam queda dos investimentos de algumas das principais distribuidoras do país, como Light, Cemig, Ampla e CPFL.

"O setor de energia elétrica vive um momento de imensa instabilidade jurídica que tem como consequência essa retração do mercado", analisa o presidente do Instituto Acende Brasil, Cláudio Sales. "As dificuldades começaram no segundo ciclo de revisão tarifária, no ano passado, que implicou em uma redução média de 30% na geração de caixa das distribuidoras, e se acentuaram após a lei 12.783, que atingiu também a geração", completa ele.

A lei entrou em vigor em janeiro, estabelecendo as bases para a renovação das concessões de geração de energia no país e abrindo espaço para a redução do preço da eletricidade. Com a queda de receita, as empresas voltaram-se para a renegociação de contratos com os maiores fornecedores. Segundo especialistas, trata-se de um momento de adaptação e redimensionamento ao novo cenário do setor energético brasileiro.

Executivo de uma gigante de equipamentos elétricos diz que a ordem é reestruturar equipes e procedimentos nas unidades de produção, além de renegociar contratos com seus fornecedores, para cortar custos ao máximo. "Neste momento, não estamos pagando ninguém", confidencia, sob a condição do anonimato. Ninguém fala abertamente sobre o assunto, mas a impressão geral é que inadimplência entre as empresas do setor é crescente.

Barbato diz que, além das mudanças no cenário local, o câmbio e a concorrência internacional contribuíram para o mal desempenho do ano. Segundo dados da Abinee, o segmento GTD teve um déficit comercial de US$ 624 milhões no primeiro semestre de 2013, alta de 72% com relação ao verificado no mesmo período do ano passado. Em todo o ano de 2012, o saldo negativo foi de US$ 720 milhões. Os principais fornecedores estrangeiros ao mercado brasileiro são empresas chinesas e indianas.

Além de Alstom e Siemens, fontes do mercado falam em dificuldades na Orteng, empresa de origem mineira que tem atividades também em GTD. Números da única grande do setor com capital aberto no país, a WEG indicaram estabilidade nas vendas de equipamentos para geração, transmissão e distribuição no segundo trimestre. Apesar disso, diz relatório do Banco do Brasil Investimentos sobre a empresa, teve bons resultados devido à "capacidade da companhia em conseguir ganho de eficiência operacional e de rentabilidade, diante de um cenário de atividade industrial moderada no país e, principalmente, no exterior".

Foco em custos também nas gigantes do setor

Os balanços das gigantes multinacionais apontam queda nas receitas globais do setor e foco em redução de custos. A Siemens, por exemplo, anunciou no início do ano o fechamento de duas unidades ligadas à produção de equipamentos para geração de energia eólica na Espanha. As duas empresas, porém, apostam em melhora da situação até o final do ano, embora com margens ainda baixas. "Para o ano fiscal de 2013 (que termina em setembro), a Siemens espera um crescimento das encomendas e uma queda moderada na receita, em comparação com o ano anterior", diz a empresa, no comunicado de divulgação do resultado do terceiro trimestre do ano fiscal de 2013, segundo o calendário europeu, encerrado em junho.

O balanço da Alstom, por sua vez, mostra uma queda de 5% na receita do setor, por conta da suspensão de projetos, principalmente na Índia.A reestruturação das atividades as empresas no Brasil tem também relação com as denúncias de formação de cartel em concorrências realizadas pelo governo de São Paulo, que provocaram a demissão do comando da Siemens no Brasil. O caso está sendo investigado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

NÚMEROS

R$ 624 mi: Déficit comercial do setor de geração, transmissão e distribuição no primeiro semestre de 2013, alta de 72% com relação a 2012.

10%: Previsão de crescimento das vendas do segmento, que será revista pela Abinee com base no desempenho do primeiro semestre.

30%: Redução média da geração de caixa das distribuidoras de energia, com a revisão tarifária do ano passado, que provocou a suspensão de investimentos.

Setor tem quatro leilões no segundo semestre

Nem a perspectiva de leilões de geração e transmissão deste segundo semestre melhoram o humor do setor. Até agora, foram realizados dois leilões de geração de energia, um para parques eólicos e outro para térmicas e hidrelétricas, com a contratação de 2,9 mil megawatts (MW) de capacidade instalada. Até dezembro, estão previstos mais dois leilões de geração e dois de transmissão.

"O segundo semestre costuma ser melhor, mas não estamos vendo boas perspectivas este ano", diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato. Na sua avaliação, os investimentos continuarão em ritmo lento e o câmbio ainda não chegou ao patamar ideal de competitividade para o setor, que seria de R$ 2,60 a R$ 2,70 por dólar, para justificar aumento das exportações.

Para o próximo leilão de geração, com entrega de energia em 2016, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) informou ontem que foram cadastrados 784 projetos, com capacidade total de 19,4 mil MW. A maior parte (15 mil MW) provenientes de parques eólicos. Pela primeira vez, há a participação de empreendimentos de geração solar - são 109, somando potência instalada de 2,7 mil MW.

Previsto para novembro, o leilão de transmissão terá 17 lotes, entre linhas e subestações, nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Ceará, Paraná, Pará, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Piauí e Acre. O edital da concorrência estará em audiência pública até o próximo dia 24.

O primeiro leilão de transmissão do ano, realizado em julho, terminou com a contratação de cinco dos sete lotes oferecidos. Um dos lotes que não teve interessados, que liga as usinas do Rio Madeira a São Paulo, estava sendo oferecido pela segunda vez.

"O setor elétrico apresenta grande incerteza no curto prazo", diz o Relatório Setorial de Análise de Investimentos do Banco do Brasil, citando como fatores de instabilidade a definição sobre o preço da energia e sobre a divisão do custo das térmicas.

Fonte: Brasil Econômico

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